POLÍTICAS PÚBLICAS PARA DOENÇAS CRÔNICAS EM MOÇAMBIQUE, ANGOLA E CABO VERDE: ESTUDO DOCUMENTAL

 

PUBLIC POLICIES FOR CHRONIC DISEASES IN MOZAMBIQUE, ANGOLA AND CAPE VERDE: DOCUMENTARY STUDY

 

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA ENFERMEDADES CRÓNICAS EN MOZAMBIQUE, ANGOLA Y CABO VERDE: ESTUDIO DOCUMENTAL


 

1Ainoã de Oliveira Lima

2Clara Beatriz Costa da Silva

3Thiago Moura de Araújo

4João Cruz Neto

5Rafaella Pessoa Moreira

6Amanda Cavalcante Maia

7Francisco Jardsom Moura Luzia

8Hilderlânia de Freitas Lima

 

1 Enfermeira. Mestranda em Enfermagem. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9221-7551. E-mail: ainoaoliveiralima@outlook.com.

2 Enfermeira. Mestranda em Enfermagem. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6104-9612 E-mail: clarabeatrizc10@gmail.com

3 Enfermeiro. Doutor em Enfermagem. Docente do Instituto de Ciências da Saúde. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8410-0337. E-mail: thiagomoura@unilab.edu.br

4 Enfermeiro. Mestrando em Enfermagem. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: http://orcid.org/0000-0002-0972-2988.E-mail: enfjcncruz@gmail.com.

5 Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente do Instituto de Ciências da Saúde. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2341-7936 E-mail: rafaellapessoa@unilab.edu.br

6 Enfermeira. Mestranda em Enfermagem. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5480-9951 E-mail: enfermeira.amandacavalcante@gmail.com

7 Enfermeiro. Mestrando em Enfermagem. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8386-6103. E-mail: jardsommouraenf@aluno.unilab.edu.br

8 Enfermeira. Mestranda em Enfermagem. Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Redenção, Ceará, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3755-0340. E-mail: hilderlanialima@gmail.com

 

RESUMO:

Objetivo: analisar os documentos oficiais, sobre a evolução das políticas de saúde voltada às doenças crônicas em Moçambique, Angola e Cabo Verde. Método: Estudo documental, qualitativo. O lócus do estudo foram sites oficiais de países lusófonos. A busca ocorreu de julho a outubro de 2022. Os dados foram coletados por meios dos sites e documentos oficiais disponíveis eletronicamente.  Resultados: Foram encontradas políticas de investigação situacional, enfrentamento e controle. Contudo, há dificuldades no acesso, planejamento, implementação e avaliação das metas traçadas para o cuidado aos pacientes portadores de DCNT. As políticas foram divulgadas nos últimos trinta anos, o que denota a insuficiência de arcabouço de fortalecimento da rede. Conclusão: Os documentos não expressam os resultados obtidos após implementação de estratégias o que ainda é uma lacuna importante a ser investigada.

Palavras-Chave: Doença crônica; Indicadores de doenças crônicas; África Oriental; Registros.

 

ABSTRACT

Objective: to analyze the official documents on the evolution of health policies for chronic diseases in Mozambique, Angola and Cape Verde. Method: Qualitative documental study. The locus of the studies were official websites of lusophone countries. The search was conducted from July to October 2022. Data were collected from websites and official documents available electronically.  Results: Situational research, confrontation and control policies were found. However, there are difficulties in access, planning, implementation and evaluation of the goals set for the care of patients with NCDs. The policies were published in the last thirty years, which denotes the insufficiency of a framework to strengthen the network. Conclusion: The documents do not express the results obtained after implementation of strategies, which is still an important gap to be investigated.

Keywords: Chronic Disease; Chronic Disease Indicators; Africa, Eastern; Records.

 

RESUMEN

Objetivo: analizar los documentos oficiales sobre la evolución de las políticas sanitarias relativas a las enfermedades crónicas en Mozambique, Angola y Cabo Verde. Método: Estudio cualitativo y documental. Los estudios se centraron en sitios web oficiales de los países lusófonos. De julio a octubre de 2022, los datos se recopilaron en varios sitios y documentos oficiales disponibles electrónicamente. Resultados: Foram encontradas políticas de investigação situacional, confrontação e controle. Sin embargo, existen dificultades en el acceso, planificación, implementación y evaluación de las metas trazadas para el cuidado de los pacientes portadores de DCNT. As políticas foram divulgadas nos últimos trinta anos o que denota a insuficiência de arcabouço de fortalecimento da rede. Conclusión: Los documentos no expresan los resultados obtenidos tras la aplicación de las estrategias, lo que sigue siendo una laguna importante que debe investigarse.

Palabras clave: Enfermedad Crónica; Indicadores de Enfermedades Crónicas; África Oriental; Registros.

 

Autor Correspondente

Ainoã de Oliveira Lima

Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira. Av. da Abolição, 3 - centro, Redenção – CE – Brasil. 62790-000. E-mail: ainoaoliveiralima@outlook.com. Tel: +55(88) 99636-3966

 

Submissão: 09-01-2023

Aprovado: 17-07-2023

 


INTRODUÇÃO

            A modificação no paradigma de saúde e doença pode ser resumida em três grandes vertentes, o aumento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) em detrimento das doenças contagiosas, o retardo proporcional da morbimortalidade do público mais jovem para os mais idosos e a ascendência de quadros de morbidade em comparação com os índices de mortalidade, elevando portanto, a expectativa de vida da população(1).

            As DCNT são um problema de saúde pública que emergiram com maior visibilidade a partir da mudança dos modelos de saúde. Neste cenário, as DCNT integram um grupo de enfermidades com causas multifatoriais, representadas em sua maioria por fatores comportamentais que demandam certo tempo até se expressarem os agravos(2).

            Dentre as DCNT mais incidentes têm-se: as doenças cardiovasculares, o câncer, o diabetes mellitus (DM) e as doenças respiratórias com aproximadamente 33,2 milhões de mortes no mundo(3). Essa problemática teve maior visibilidade durante a pandemia da COVID-19, período no qual as pessoas com doenças crônicas (DC) representaram 70% dos óbitos em estágio grave da doença. Dessa forma, as condições crônicas se estabeleceram devido às formas graves de infecção pelo SARS-CoV-2 resultando em sequelas substanciais(4).

            O impacto das DC suscitou desde cedo estratégias globais de controle, como a Carta de Ottawa e a Declaração de Adelaide que incentivava os países parceiros a implementarem estratégias de estímulo a um estilo de vida mais saudável(5,6). Afetam sobremaneira os países de média e baixa renda, o que descortina a necessidade de adequações nos serviços de saúde e elaboração de políticas públicas consistentes que abarque a nova realidade epidemiológica desses países(7,8).

            Atualmente é pauta dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), estimulando cooperações técnicas entre alguns países como os da Comunidade de Língua Portuguesa (CPLP) e os Países de Língua Portuguesa (PALOP) a colaborarem para o alcance das metas(9).

            Em março de 2022, houve a IV Reunião dos Ministros da CPLP, onde aprovaram a Resolução Sobre o Plano de Abordagem às Doenças Crônicas Não Transmissíveis na CPLP, com estímulo ao fortalecimento de políticas públicas e reorientação dos serviços de saúde(10). A comunidade é composta justamente do público mais afetado pelas DC, os países desenvolvidos (Portugal), em desenvolvimento (Brasil) e os países subdesenvolvidos (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste), em função de uma maior precariedade dos determinantes sociais em saúde que causam agravo dos fatores de risco, como também devido a fragilidade dos sistemas de saúde que não possuem acesso universal(8).

            Por meio das pactuações nos fóruns de discussão da Organização Mundial de Saúde (OMS), os países africanos da CPLP adotam diretrizes factíveis de implementação para redução das DCNT com foco em seus fatores principais como sexo, idade, vulnerabilidade socioeconômica, uso ou consumo nocivo de álcool e outras drogas, sedentarismo e obesidade com vistas a fomentar politicas públias para dirimir esses fatores. Dentre os países da CPLP, os localizados no continente africano, enfrentam dupla diligência no combate simultâneo às DCNT e doenças infecto-contagiosas, sob amparo de sistemas de saúde ainda em readequação para nova fase epidemiológica(1,8,11).

            Nesse contexto destacam-se na elaboração e divulgação de políticas públicas em países africanos voltadas às DCNT nas repúblicas de Moçambique, Angola e Cabo Verde. A primeira enfrenta uma onda de dupla propagação de doenças transmissíveis e de DCNT requerendo mais ações assistenciais e de vigilância, Cabo Verde possui alto consumo de bebida alcoólica, o que expõe maior vulnerabilidade em relação aos demais. Já Angola, apesar da transição epidemiológica, ainda não possui um plano estratégico voltado às DCNT(11).

            Perante o desequilíbrio dos fatores das doenças crônicas e da necessidade de políticas públicas com foco no enfrentamento, o estudo tem por objetivo analisar os documentos oficiais, sobre a evolução das políticas de saúde voltada às doenças crônicas em Moçambique, Angola e Cabo Verde.

 

MÉTODO

            Trata-se de um estudo descritivo, documental e com abordagem qualitativa com foco nas políticas públicas das DCNT nos países africanos da CPLP.

 

Seleção e critérios das fontes de pesquisa

            Apesar da formalização de um plano de abordagem contra DCNT nos países da CPLP, poucos disponibilizam políticas de investigação, controle e/ou enfrentamento à doenças crônicas. Por isso, este estudo optou por uma investigação em políticas de saúde à DCNT disponíveis publicamente online e que atendessem ao escopo de promoção da saúde preconizado no plano em questão(8). Além disso, a política deveria estar vinculada a um site oficial do governo. Nesse sentido, apenas três países fizeram parte da amostra deste estudo(12-14).

            O estudo foi realizado entre Julho e Outubro de 2022. A busca ocorreu nos sites oficiais por dois pesquisadores distintos e de forma pareada com auxílio de um instrumento para coleta de dados. No material continham variáveis como ano da política, país, tema da política, doenças alvo de intervenção além de estratégias de investigação situacional, enfrentamento e controle.

            Para a coleta de dados foi realizada a leitura na íntegra dos documentos, com foco nas sessões que abordavam os dados requeridos (planos estratégicos e intersetoriais, resoluções decretos, inquéritos e programas de investigação e controle as DNT) foram extraídos e dispostos no Microsoft Excel, com seus respectivos períodos de vigência.

 

Extração das fontes de evidência e análise dos documentos

            A extração dos dados ocorreu por meio de documentos (planos estratégicos, resoluções, leis, portarias, manuais e sites) disponibilizados pelos órgãos governamentais dos respectivos países. Por se tratar de um artigo documental que visa a evolução das políticas, não se estabeleceu recorte temporal para triagem do material bibliográfico. Desta forma, justifica-se a representatividade da amostra tendo em vista a necessidade de contemplar o maior número de políticas possíveis.

            Outros estudos verificados por meio da busca manual, foram relacionados a conferências internacionais, documentos de organizações governamentais, artigos que abordaram ODS e Global Burden Disease na CPLP; ofereceram suporte teórico para a discussão da presente pesquisa.

            A análise dos dados foi realizada em expositivo-narrativo contemplando-se o contexto epidemiológico e ascensão de políticas de controle às doenças crônicas não transmissíveis em Moçambique, Angola e Cabo Verde.

 

RESULTADOS

            As políticas encontradas foram observadas em duas áreas, quais sejam: políticas de investigação situacional, enfrentamento e controle conforme disposto no quadro 1.


Quadro 1 – Síntese das políticas de saúde no cenário dos países lusófonos. Redenção-CE, Brasil, 2022.

ESTRATÉGIAS DE INVESTIGAÇÃO SITUACIONAL

 

 

CABO VERDE

2008: I Inquérito Nacional sobre os Fatores de Risco das Doenças Não Transmissíveis (IDNT I)

2021: II Inquérito Nacional sobre os Fatores de Risco das Doenças Não Transmissíveis (IDNT II)

 

MOÇAMBIQUE

2005 – 2015: Inquérito sobre os Fatores de Risco para Doenças não Transmissíveis

ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO E CONTROLE

 

ANGOLA

2010: Decreto n.º 43/09 de 2010 - Proibição de fumar em locais públicos

2018-2022: Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN)

 

 

 

 

 

 

 

 

CABO VERDE

2009-2011: Plano de Ação de Prevenção e Controlo das Doenças Cardiovasculares

2009-2011: Programa Nacional de Nutrição

2009-2011: Plano de Ação de Luta Contra o consumo nocivo do álcool e Alcoolismo

2011: Programa Nacional de Doenças Não Transmissíveis

2015 - 2020: Plano Multissetorial de Prevenção e Controle de Doenças Não-Transmissíveis em Cabo Verde

2016: Resolução n.º 51/2016 - Controle da fabricação etílica através de impostos fiscais

2019-2023: Primeiro Plano Estratégico Nacional para o Controle do Tabaco

 

MOÇAMBIQUE

2008 – 2014: Primeiro Plano Estratégico voltado às DNTs em Moçambique

2020 – 2029: Plano Estratégico Multissetorial de Prevenção e Controle de Doenças Não Transmissíveis

Fonte: Elaborado pelos autores. Redenção-CE, Brasil, 2023.

                       


O Primeiro Plano Estratégico voltado às DNTs em Moçambique foi direcionado aos anos de 2008 a 2014. Atualmente o plano estratégico em vigor no país é intitulado como “Plano Estratégico Multissetorial de Prevenção e Controle de Doenças Não Transmissíveis 2020 - 2029'', cujo alcance das metas está previsto para o período entre 2020 - 2029(11).

            O risco de mortalidade prematura atribuída às DNT no país é estimado em 18%, além disso, já se prevê que um terço das mortes no país sejam em decorrência de enfermidades como diabetes, câncer, hipertensão arterial e obesidade.  O diabetes e a hipertensão, em especial, têm-se mostrado em crescimento evidente no país, com uma prevalência dobrada nos últimos dez anos (de 3,4% para 39%, respectivamente)(11).

            Diante deste cenário, Moçambique estabeleceu como metas nacionais a redução do risco de mortalidade prematura por DNTs, do consumo de tabaco, da inatividade física e da hipertensão arterial (HAS) em 10%. Quanto ao consumo de álcool, o país espera que haja redução em 5% e que o aumento do diabetes e da obesidade sejam contidos(11).

            Embora na Angola um plano exclusivamente destinado ao combate às DCNTs seja inexistente, ressalta-se que em seu Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018-2022, são estabelecidas algumas prioridades para o setor saúde, dentre elas, destacam-se a expansão e melhoria do acesso aos serviços de saúde por meio de unidades sanitárias voltadas aos cuidados primários em saúde. No documento também é destacado, o intuito do país em promover a articulação e organização destas unidades, de forma a integrar os três níveis de atenção e criar rede de serviços, para atendimento às pessoas com Doenças Crônicas não Transmissíveis e fatores de risco relacionados(12).

            Dentre as metas direcionadas às DCNTs para o ano de 2022, são mencionadas, a criação e operacionalização do Comitê Nacional de Coordenação das Doenças Crônicas não Transmissíveis, elaboração do plano estratégico da Política Nacional Contra o Câncer e a inclusão em unidades sanitárias de medicamentos e tecnologia relacionada com as Doenças Crônicas não Transmissíveis e seus fatores de risco de acordo com o nível de assistência(12).

            O marco das estratégias de abordagem às DCNT em Cabo Verde, veio em 2007, com a percepção da dupla epidemia, expressada através de um maior número de internamentos referentes a esse público. Deu-se início ao I Inquérito Nacional sobre os Fatores de Risco das Doenças Não Transmissíveis (IDNT I), através do Plano STEPS, uma iniciativa da OMS que sistematiza a coleta de dados referentes aos fatores de risco às DCNT em uma perspectiva comportamental e biológica. Os resultados apontaram o sobrepeso, consumo nocivo de álcool, prevalência de hipertensão e dislipidemia, como os piores índices(11-12).

            Em 2011 foi lançado o Programa Nacional de Doenças Não Transmissíveis, que atuou juntamente com outros planos específicos já existentes, como o Programa Nacional de Nutrição; o Plano de Ação de Luta Contra o consumo nocivo do álcool e Alcoolismo e o Plano de Ação de Prevenção e Controlo das Doenças Cardiovasculares 2009-2011, a articulação também contou com outros setores, no fortalecimento das estratégias de promoção das saúde(13).

            Posteriormente, em 2014, se deu a elaboração do Plano Multissetorial de Prevenção e Controle de Doenças Não-Transmissíveis em Cabo Verde 2015-2020, que objetivava um ambiente propício onde fossem minimizados e/ou eliminados a exposição aos fatores de risco modificáveis. Para tal, se propunha uma solução multissetorial, com a inclusão de diferentes setores sociais. Além das abordagens já utilizadas no plano anterior, esta estratégia requer um maior fortalecimento do serviço no tocante à prevenção, e monitoramento do curso das DNT, bem como vigilância das medidas de controle utilizadas(13). Recentemente em 2021 realizou-se o II Inquérito Nacional sobre os Fatores de Risco das Doenças Não Transmissíveis (IDNT II), em específico este inquérito visou conhecer a situação epidemiológica de HAS, DM e risco modificáveis como sedentarismo, dislipidemia, obesidade, tabagismo e etilismo. O estudo contou com 4.563 indivíduos, dos quais 12,5% eram adeptos ao tabaco, 45% a bebidas alcoólicas e 10,2% ao consumo de sal em excesso.

            Em Moçambique, o plano estratégico visa a redução da morbimortalidade e incapacidades relacionadas ao uso do tabaco, álcool, inatividade física, alimentação não saudável, redução da mortalidade por DM, HAS e obesidade.

 

DISCUSSÃO

            Os documentos analisados apontam que o planejamento intersetorial é a forma mais eficaz de controle das DNTs, considerando sua multifatoriedade e repercussão generalizada em diversos âmbitos. A elaboração de políticas baseadas na articulação de ações sistematizadas e horizontais condizentes com as particularidades de risco de cada território, agregadas à fiscalização da implementação e execução correta, têm se mostrado assertivas(16).

            Conforme o Plano Estratégico Multissetorial de Prevenção e Controle de Doenças Não Transmissíveis de Moçambique, algumas doenças crônicas como, o diabetes e a hipertensão, em especial, têm mostrado crescimento evidente no país. Segundo o Inquérito sobre os Fatores de Risco para Doenças não Transmissíveis de Moçambique, essa tendência pode estar associada ao processo de desenvolvimento econômico e mudanças negativas na dieta e estilos de vida(11).

            Embora seja evidente a redução da prevalência em alguns fatores de risco como consumo do tabaco, bebidas alcoólicas e no sedentarismo, houve redução também no consumo de frutas e vegetais e aumento da hipertensão, diabetes e obesidade, quando comparados os dados de 2005 com os de 2015. O que se configura como um desafio para o país, visto que os maus hábitos alimentares são importantes fatores de risco para o desenvolvimento de muitas doenças como, as cardiovasculares, diabetes mellitus e obesidade(23).

            Conforme destacado em seu texto, o plano de Moçambique tem como foco principal a redução da carga evitável de morbimortalidade e incapacidade devido às Doenças Não Transmissíveis, para   isso, será dada atenção a algumas áreas estratégicas como governação e liderança, redução dos fatores de risco (como consumo do tabaco, bebidas alcoólicas e no sedentarismo), manejo de casos das doenças não transmissíveis e vigilância, monitoria, avaliação e investigação. Também é destacado que as ações serão voltadas a redução da exposição aos fatores de risco e reforço do sistema de saúde para prevenção e controle destas doenças, por meio da participação de múltiplos setores e esferas, sendo incluída a participação da sociedade civil(11).

            Com relação à prevalência dos fatores de risco, o país se baseia em informações obtidas a partir do inquérito sobre os Fatores de Risco para Doenças não Transmissíveis cuja última análise dos dados ocorreu entre os anos de 2005 - 2015, neste inquérito, direcionado a fatores de risco como: (como consumo do tabaco, bebidas alcoólicas e no sedentarismo). Uma das metas propostas no Plano estratégico atual consiste na atualização destes dados(11).

            Considerando o cenário de aumento das DNT ao qual o país tem vivenciado, seguindo o padrão epidemiológico mundial, ou seja, aumento de doenças crônicas não transmissíveis(11). A implementação de planos, políticas ou estratégias de identificação de fatores de risco são pertinentes para o favorecimento de medidas com foco na mitigação dos principais fatores de risco associados às DCNTs(24).

            Quanto aos dados em saúde voltados às doenças crônicas não transmissíveis e aos planos estratégicos desenvolvidos direcionados a elas na Angola, é percebido que o país ainda não apresenta planos direcionados a estas doenças, todavia, o país tem mostrado empenho no combate a alguns fatores de risco que impactam na prevalência das DCNT, como o controle do tabaco que conferiu ao país a medalha e certificado de mérito “Mundo Sem Tabaco” pela OMS em 2019(3).

            O sucesso nas medidas de controle ao tabaco no país foram apontadas como consequências principalmente da adoção de vários Decretos-leis com foco na proteção dos seus cidadãos dos efeitos nocivos do uso do cigarro(17).

            Como Decretos-leis destacam-se o Decreto n.º 43/09 de 2010 voltado a proibição do consumo de qualquer forma de cigarros, charutos e demais produtos similares em locais públicos e a aplicação de multas destacada no artigo 4.º do Decreto n.º 43/09(17). Além disso, o país também buscará adotar em seu sistema da saúde, a estratégia PEN-PLUS, em que se destaca o nível primário como ponto inicial para o diagnóstico, tratamento e gerência do grupo de enfermidades não transmissíveis, e o maior acesso de pessoas ao atendimento em clínicas privadas no caso de situações graves(3).

            Além do PDN, o país conta com uma Política de Saúde que apresenta como objetivo assegurar uma vida mais longa e saudável à população, promovendo a melhoria       no estado sanitário da sua população e buscando combater a pobreza(12). Segundo o Monitoramento de Doenças não Transmissíveis da OMS, realizado em 2020, 70% das mortes em Cabo Verde, se devia às DCNT, e a população apresenta um risco de 17% de risco de mortes prematuras pela mesma causa(3).

            Em Cabo Verde, a absorção dos dados impulsionou pela primeira vez a inclusão de estratégias no Plano Nacional de Saúde, que trazia como prioridade o controle das doenças cardiovasculares, do diabetes e do câncer. Um dos principais pontos abordados nesse plano era a formação de recursos humanos especializados em saúde, bem escassos no país na época, prioritariamente médicos cardiologistas e profissionais de enfermagem. Em 2010 após nova investigação, o país constatou novamente o curso da transição epidemiológica(13,18).

            Concomitante às estratégias gerais, foram sendo lançadas medidas de conscientização por meio de programas de rádio, televisão, feiras de saúde, estabelecimento de dias temáticos para hipertensão, diabetes e câncer em nível primário, a disponibilização de insumos descartáveis e eletrônicos e a contratação de mais membros de uma equipe multiprofissional, em nível secundário, e em nível terciário a estruturação de atenção especializada. Em todos os níveis houve a digitalização das informações e classificação das doenças com base no CID(13).

            Em paralelo, os fatores de risco foram abordados em outras vertentes. Houve uma forte campanha de conscientização do uso abusivo do álcool, onde o governo implementou a Resolução n.º 51/2016 que estabelece melhor controle sobre a fabricação etílica através do estabelecimento de impostos fiscais(19).

            A implementação desta medida visando a minimização do consumo abusivo de álcool é uma importante iniciativa, tendo em vista que, a baixa regulamentação e a divulgação demasiada da indústria de produção do álcool são fatores que contribuem para o aumento deste consumo dentro do país(25).

            Em 2021 realizou-se o II Inquérito Nacional sobre os Fatores de Risco das Doenças Não Transmissíveis (IDNT II), onde constatou-se que mesmo após a implantação de medidas de controle aos fatores de risco, as fragilidades permanecem, referentes ao tabaco, índices elevados de inatividade física e alimentação pouco saudável, novamente houve destaque para o consumo de álcool como o fator mais gritante(20).

            Cabo Verde integra a  lista de países contemplados com a iniciativa Convenção Quadro para o Controle do Tabaco (CQCT) organizada pela OMS, que resultou na criação do Primeiro Plano Estratégico Nacional para o Controle do Tabaco (2019-2023), obtendo ajustamento sobre as políticas fiscais com um aumento de 30% para 50% sobre os impostos, implementando a Taxa Específica do tabaco de 20 Escudos Cabo Verdianos (R$ 0,93) sobre cada maço vendido e a fiscalização para remate do comércio ilícito de produtos do tabaco(20).

            Essa estratégia deu ao país em 2021 o Prêmio das Nações Unidas para a Prevenção e Controle de Doenças Não Transmissíveis em reconhecimento ao seu esforço no fortalecimento da política tributária do tabaco. O prêmio deu visibilidade ao país no âmbito do manejo multisetorial das doenças crônicas(21).

            Apesar dos avanços de Cabo Verde, Angola e Moçambique na formulação de estratégias de controle às DCNTs, a maioria desses países ainda luta por um acesso universal aos serviços de saúde e um sistema equitativo que possibilite a atenção integral das populações mais vulneráveis. Também se reconhece a necessidade de ampliação quanto aos recursos humanos qualificados para a saúde e sua capacitação no cuidado a pessoas com DCNT, tendo em vista que muitos têm conhecimento insuficiente sobre tais doenças. Os recursos financeiros internos e externos insuficientes, também são destacados como limitadores da capacidade de resposta dos países do continente africano às doenças crônicas não transmissíveis. A fragilidade nos sistemas de informação sanitária concernente aos fatores de risco e a carga das DNTs nos países, como também a fragilidade nos sistemas de saúde são barreiras para o alcance das metas estabelecidas(14).

            A adoção de um sistema voltado a atenção primária à saúde por países como Moçambique, têm sido mais dificultosa em consequência da instabilidade política e momentos de guerra civil que o país enfrentou décadas atrás, prejudicou o financiamento ao sistema de saúde e comprometeu a instalação dos serviços em comunidades mais remotas e vulneráveis, centralizando-as devido ao deslocamento dessas comunidades para a zona urbana. O país vem se esforçando na descentralização dos serviços para comunidades mais carentes(14).

            Para enfrentamento de tais situações, é necessário boa estruturação dos sistemas de saúde, que devem ter fontes de financiamento bem estabelecidas para implementação das políticas vigentes e assistência adequada à população(9). Divergência encontrada entre alguns países da CPLP, enquanto o Brasil possui o Sistema Único de Saúde, que permite acesso universal à população, outras federações possuem sistemas fragilizados e sucateados, deixando a maioria do público descoberta.

            As condições de saúde desses países são uma das fortes motivações das cooperações técnicas em saúde no auxílio ao controle de situações e agravos que se sobressaem aos limites geográficos de cada um, a execução da diplomacia em saúde e das cooperações técnicas são um dar e receber simultâneo, que permite aos países parceiros não só auxiliá-los na prestação de serviços de saúde, como o aprimoramento da própria promoção e vigilância a partir do conhecimento considerando a pluralidade racial da população mundial(22).

            A elevação dos fatores de risco foi elemento crucial na ascensão das DCNT, nesses como em todos os outros países do mundo, entretanto devido à baixa expectativa de vida de alguns deles, como Moçambique, que ao passo que há um aumento nessa taxa, apresenta diminuição da taxa de fecundidade, centraliza o fardo das DCNT sob a população adulta jovem, acarretando maiores problemas econômicos. Circunstância que vem mais uma vez se opor ao aprimoramento dos serviços de saúde.

            Como limitações ao estudo, têm-se a escassa literatura especializada em DCNT voltada a países lusófonos, em especial os que foram alvo dos lócus deste estudo. As políticas são frágeis e muitas não possuem informações suficientes sobre sua implementação, fiscalização e efetivação.          Atenta-se ainda a precariedade no acesso a recursos que permitam a elucidação de estratégias para enfrentamento das DCNT nesses países.

            Os achados deste estudo permitem a profissionais, gestores e comunidade em geral endossar a cobrança por políticas públicas efetivas para DCNT no âmbito africano, bem como alerta para a necessidade de fiscalização por meio do controle social. Nesse sentido fortalece a importância de atentar-se a novas estratégias de rastreamento com busca ativa da população e incentivo a programas multiprofissionais de saúde com ênfase na redução dos fatores de risco modificáveis para DCNT. Desta forma, visa-se o avanço na saúde pública e nos sistemas de saúde dos países lusófonos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

            A evolução das políticas públicas nos países africanos participantes da CPLP revela diferenças significativas. Inicialmente, observa-se que os termos “planos estratégicos” e "políticas de saúde” se confundem nos sites governamentais. Isso denota que a implementação de estratégias de saúde não advém de uma política específica, mas pela operacionalização temporal de metas.

            Revela-se, ainda, uma evolução das diretrizes operacionais no que tange a metas de longo prazo que visam reduzir os fatores de risco, especialmente os modificáveis, na tentativa de diminuir a morbimortalidade. Ademais, os documentos oficiais não expressam os resultados obtidos após implementação de estratégias, o que ainda é uma lacuna importante a ser investigada.

            Portanto, necessita-se do acompanhamento, monitoramento e vigilância com a produção de indicadores de saúde para cada fator de risco com meta proposta. Além disso, faz-se necessária a fiscalização e investimento nos serviços de saúde nos países africanos com foco na redução das DCNT, está pactuação perpassa a necessidade de cooperação internacional e esforços entre gestores, profissionais de saúde e população para diminuir os fatores de risco. Estudos futuros poderão avaliar as condições de saúde e redução do risco cardiovascular nos países africanos que fazem parte da CPLP, além de fomentar uma política pública para estes países relacionada às DCNT.

 

REFERÊNCIAS

 

1.         Silva Neto BR. Medicina: aspectos epidemiológicos, clínicos e estratégicos de tratamento 3rd. São Paulo: Atena; 2021. 38 p.

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Contribuição dos Autores

Ainoã de Oliveira Lima - concepção, delineamento, análise e interpretação dos dados e aprovação da versão final.

Clara Beatriz Costa da Silva - concepção, delineamento ou a análise e interpretação dos dados e aprovação da versão final.

João Cruz Neto - redação do artigo, interpretação dos dados, revisão crítica e aprovação da versão final. Thiago Moura de Araújo - concepção e o delineamento ou a análise, interpretação dos dados e aprovação da versão final.

Rafaella Pessoa Moreira - delineamento ou a análise, redação do artigo, interpretação dos dados e aprovação da versão final.

Amanda Cavalcante Maia- redação do artigo ou a sua revisão crítica e aprovação da versão final. Francisco Jardsom Moura Luzia- revisão crítica e aprovação da versão final.

Hilderlânia de Freitas Lima - revisão crítica e aprovação da versão final.

 

Conflitos de interesse: Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Fomento / Agradecimento: O presente estudo não possui financiamento.