ARTIGO ORIGINAL
DÉFICIT EM HABILIDADES DE AUTOCUIDADO EM PESSOAS COM TEA: DETECÇÃO E INTERVENÇÕES POR ENFERMEIROS(AS)
DEFICIT IN SELF-CARE SKILLS IN PEOPLE WITH ASD: DETECTION AND INTERVENTIONS BY NURSES
DÉFICIT EN HABILIDADES DE AUTOCUIDADO EN PERSONAS CON TEA: DETECCIÓN E INTERVENCIONES POR ENFERMERAS
https://doi.org/10.31011/reaid-2024-v.98-n.3-art.1685
1Francidalma Soares Sousa Carvalho Filha
2Eutima Klayre Pereira Nunes
3Maria Vitória Melo de Oliveira
4Jaiane de Melo Vilanova
5Marcus Vinicius da Rocha Santos da Silva
6Janderson Castro dos Santos
1Universidade Estadual do Maranhão. Orcid: https://orcid.org/0000-0001- 5197-4671
2 Universidade Estadual do Maranhão. Orcid: https://orcid.org/0000-0003- 2187-8368
3Universidade Estadual do Maranhão. Orcid: https://orcid.org/0000-0003- 4947-5640
4Universidade Estadual do Maranhão. Orcid: https://orcid.org/0000-0001- 8271-0177
5Centro Universitário Internacional UNINTER Orcid: https://orcid.org/0000-0002- 5905-6434
6 Universidade Federal do Piauí. Orcid: https://orcid.org/0000-0002- 7508-5358
Autor correspondente
Marcus Vinicius da Rocha Santos da Silva
Conselho Regional de Enfermagem do Paraná. Rua Prof. João Argemiro Loyola, 74 - Seminário, Curitiba - PR, Brasil. 80240-530. E-mail: marcusvinicius.darocha@yahoo.
Submissão: 05-02-2023
Aprovado: 22-06-2024
RESUMO
Objetivo: Analisar as Intervenções de Enfermagem disponibilizadas em uma Classificação Internacional, que podem ser utilizadas para o ensino de habilidades de autocuidado a pessoas no Espectro Autista. Método: Estudo descritivo com abordagem qualiquantitativa. Participaram da investigação 23 estudantes, sendo que a coleta de dados aconteceu no período de junho de 2018 a julho de 2019, por meio da aplicação do instrumento validado Avaliação das Habilidades Básicas de Língua e Aprendizagem – Revisado. Resultados: A maioria dos estudantes que não conseguiu realizar as atividades de vestir-se estão na faixa etária de 5 e 10 anos. Quanto à alimentação, as tarefas que os estudantes menos conseguiram realizar foram: passar manteiga no pão; cortar comida com a faca; ajudar a pôr a mesa. Referente à manutenção pessoal, as mais prejudicadas foram: lavar e secar o rosto; pentear ou escovar os cabelos; escovar os dentes. Sobre as habilidades de higiene, as ações que a maioria dos estudantes não conseguiu realizar foram: pedir para usar o banheiro quando necessário; limpar-se após defecar; e usar o banheiro de forma independente. Conclusão: Na Classificação das Intervenções de Enfermagem existem diversos grupos de intervenções capazes de propiciar às pessoas com TEA uma assistência que busque atender às necessidades.
Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista; Autocuidado; Enfermagem; Processo de Enfermagem.
ABSTRACT
Objective: To analyze the Nursing Interventions available in an International Classification, which can be used to teach self-care skills to people on the Autistic Spectrum. Method: Descriptive study with qualitative and quantitative approach. 23 students participated in the investigation, and data collection took place from June 2018 to July 2019, through the application of the validated instrument Assessment of Basic Language and Learning Skills - Revised. Results: Most students who were unable to carry out the dressing activities are aged between 5 and 10 years. As for food, the tasks that the students were least able to accomplish were: buttering bread; cutting food with the knife; helping to set the table. Regarding personal maintenance, the most affected were: washing and drying the face; combing or brushing the hair; brushing teeth. Regarding hygiene skills, the actions that most students were unable to perform were: asking to use the bathroom when necessary; clean yourself after defecating; and use the bathroom independently. Conclusion: In the Classification of Nursing Interventions, there are several groups of interventions capable of providing people with ASD with assistance that seeks to meet their needs.
Keywords: Autistic Spectrum Disorder; Self-Care; Nursing; Nursing Process.
RESUMEN
Objetivo: Analizar las Intervenciones de Enfermería disponibles en una Clasificación Internacional, que pueden ser utilizadas para enseñar habilidades de autocuidado a personas en Espectro Autista. Método: Estudio descriptivo con enfoque cualitativo y cuantitativo. En la investigación participaron 23 estudiantes, y la recolección de datos ocurrió de junio de 2018 a julio de 2019, mediante la aplicación del instrumento validado Assessment of Basic Language and Learning Skills - Revised. Resultados: La mayoría de los estudiantes que no pudieron realizar las actividades de vestirse tienen entre 5 y 10 años. En cuanto a la alimentación, las tareas que los alumnos menos pudieron realizar fueron: untar pan con mantequilla; cortar la comida con el cuchillo; ayudar a poner la mesa En cuanto al mantenimiento personal, los más afectados fueron: lavarse y secarse la cara; peinarse o cepillarse el cabello; cepillarse los dientes. En cuanto a las habilidades de higiene, las acciones que la mayoría de los estudiantes no pudieron realizar fueron: pedir usar el baño cuando sea necesario; limpiarse después de defecar; y usar el baño de forma independiente. Conclusión: En la Clasificación de las Intervenciones de Enfermería, existen varios grupos de intervenciones capaces de brindar a las personas con TEA una asistencia que busca satisfacer sus necesidades.
Palabras clave: Trastorno del Espectro Autista; Autocuidado; Enfermería; Proceso de Enfermería.
INTRODUÇÃO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é entendido como uma deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação social, manifestada pela ausência de reciprocidade social e falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento; além de padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades(1).
É comum as pessoas no Espectro Autista enfrentarem dificuldades para a aquisição de habilidades necessárias à vida em sociedade, tais como: higiene e saúde (tomar banho, escovar dentes, uso de desodorante, lavagem das mãos, pentear cabelos, higiene íntima), vestimentas (incluindo uso de calçados), uso do banheiro (desde incomodar-se de fazer as necessidades fisiológicas na fralda até conseguir ir ao banheiro sozinho) e, ainda, alimentação (inclui a diversidade alimentar, alimentar-se sozinho, com ajuda parcial ou total e também a escolha de alimentos, sobretudo, novos e as texturas).
Os(as) enfermeiros(as) podem contribuir para o ensino de habilidades funcionais a pessoas no Espectro do Autismo, com vistas à aquisição do autocuidado e, consequentemente, a independência e autonomia. Para tanto, após a detecção de problemas relativos a esta e outras áreas, estes profissionais devem fazer uso da Classificação de Intervenções de Enfermagem (NIC)(2), que consiste em uma categorização de cuidados útil para o planejamento das ações, comunicação entre a equipe multiprofissional, integração de dados entre sistemas e estabelecimentos, pesquisas, mensuração de produtividade, avaliação de competência e ensino.
Destaca-se que um dos principais referenciais teóricos utilizados por enfermeiros(as) para subsidiar as suas ações trata-se da Teoria de Enfermagem do Déficit do Autocuidado de Orem, constituída de outras três teorias: Teoria de Autocuidado (descreve e explica os motivos pelos quais o autocuidado é necessário para a vida, saúde e bem-estar da pessoa), Teoria do Déficit do Autocuidado (explica quando e porque a enfermagem torna-se necessária à pessoa em relação ao cuidado) e a Teoria do Sistema de Enfermagem (explica a maneira pela qual as pessoas, em situação de déficit de autocuidado, são ajudadas pela enfermagem por meio dos sistemas totalmente e parcialmente compensatório e apoio educacional)(3).
O autocuidado deve ser realizado de forma efetiva para manter a integridade e o funcionamento estrutural humano e para prosseguir no desenvolvimento pessoal, aperfeiçoamento e amadurecimento no decorrer da vida. É uma prática apreendida e uma ação deliberada realizada de maneira contínua, de acordo com os estágios de crescimento, amadurecimento, estado de saúde e fatores ambientais do indivíduo (4).
O autor (5) acrescenta que o déficit existe e é percebido quando as atividades de autocuidado não são operáveis ou adequadas para preencher a necessidade de autocuidado existente. Nesse caso, o indivíduo necessita de auxílio, para superar ou eliminar a deficiência, ou de outra pessoa, para fazer por ele, podendo ser um cuidador ou integrante de uma equipe de saúde, a exemplo da enfermagem.
O autor (3) estabelece também cinco conceitos centrais e inter-relacionados referentes à Teoria do Déficit de Autocuidado: 1) capacidades de autocuidado (habilidades e experiências adquiridas para realizar o autocuidado); 2) ações de autocuidado (práticas realizadas em benefício próprio); 3) demandas de autocuidado terapêutico (conjunto de atividades requeridas para o atendimento ao autocuidado); 4) déficit de autocuidado (as capacidades de autocuidado são inferiores à demanda, demonstrando a necessidade de obter conhecimentos, habilidades e experiências) e, ainda, 5) capacitação em enfermagem (permite aos profissionais de enfermagem proporcionar atenção que compensa os déficits).
Portanto, o objetivo deste artigo é analisar as Intervenções de Enfermagem disponibilizadas em uma Classificação Internacional, que podem ser utilizadas para o ensino de habilidades de autocuidado a pessoas no Espectro Autista.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo com abordagem qualiquantitativa. O cenário da investigação foi o município de Balsas-MA, com população estimada em 2020 de 94.779 habitantes. Apresenta uma área de unidade territorial de 13.141,733 km², faz parte da região do Sul do Maranhão e localiza-se a 790 Km da Capital São Luís (6). Para tanto, foram locais de pesquisa cinco escolas da rede pública e três escolas da rede particular e regular de ensino, além da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), sendo que participaram da investigação 23 estudantes de 5 a 15 anos, dos quais 9 do sexo feminino e 14 do sexo masculino.
A coleta de dados aconteceu no período de junho de 2018 a julho de 2019, por meio da aplicação do instrumento validado “Avaliação das Habilidades Básicas de Língua e Aprendizagem – Revisado” (ABLLS-R), que possibilitou o levantamento de déficits e a seleção de objetivos terapêuticos, por meio da avaliação de quatro grupos de habilidades, as quais: Habilidades Básicas do estudante, Acadêmicas, Autoajuda e Motoras. Assim, neste recorte, serão apresentados os resultados referentes à avaliação das Habilidades de Autoajuda: vestir-se, alimentar-se, manutenção pessoal e higiene pessoal.
A partir dos dados oriundos da aplicação do Instrumento ABLLS-R, compôs-se um banco de dados, que foram digitados em um software Statistical Package for the Social Sciences – SPSS (versão 24.0 for Windows) e, consequentemente, foram consolidados por meio das técnicas de estatísticas descritivas (frequências absoluta e relativa). Outrossim, tais informações foram tabuladas e transformadas em quadros para subsequente análise e interpretação das mesmas. Procedeu-se a discussão dos achados com base na literatura produzida sobre o tema.
Por fim, após a análise das informações referentes as Habilidades de Autoajuda, realizou-se a interlocução com os pressupostos da Teoria do Autocuidado da Enfermeira Dorothea Elizabeth Orem3, com vistas a instrumentalizar enfermeiros quanto ao ensino de habilidades denominadas funcionais, que são essenciais à vida em sociedade e a autonomia e independência do indivíduo. Dessa maneira, de posse dos resultados da pesquisa e verificando-se os maiores déficits apresentados pelos estudantes, montou-se um programa de ensino baseado em intervenções que os enfermeiros poderiam desenvolver para ensinarem, orientarem e supervisionarem o(a) estudante e a família quanto à aquisição de tais habilidades.
Destarte, uniram-se os conhecimentos empregados por profissionais da área terapêutica de acompanhamento a pessoas no Espectro Autista, com os postulados em literatura específica da Enfermagem, como na Classificação das Intervenções de Enfermagem – NIC(2) e as próprias conjecturas das Teorias abordadas por Orem para trabalhar o ensino de habilidades de Autocuidado a este público específico.
Destaca-se que o ABLLS-R apresenta escores para classificar se o estudante consegue ou não executar a atividade, variando para algumas habilidades de 0 a 4 e, em outras, de 0 a 2. Portanto, quando o estudante recebe pontuação máxima (4), significa que conseguiu desenvolver a atividade sem ajuda; 3 significa que realizou com ajuda gestuais ou verbais; 2, conseguiu completar metade da tarefa; 1, quando realizou apenas uma pequena fração da atividade; e 0 não conseguiu fazer nada. Seguindo os mesmos parâmetros, existem habilidades que o escore maximo é 2; nesses casos, o aluno que completou toda a atividade recebe 2; se desenvolveu parte da tarefa, recebe 1; e se não executou nada, obtém 0.
O projeto de pesquisa foi submetido a Plataforma Brasil, e, em seguida, direcionado ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), sendo aprovado em 26 de maio de 2018, com número de Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 89322318.6.0000.5554 e parecer 2.677.494. Ressalta-se que foram respeitadas as normas preconizadas pela Resolução do CNS 466/12, e suas complementares, que tratam dos aspectos éticos da pesquisa envolvendo seres humanos.
RESULTADOS
O ABLLS-R utiliza letras do alfabeto para caracterizar cada grupo de habilidades avaliadas nos estudantes. Assim, as Habilidades de Autoajuda relacionam-se a Vestimentas (letra U); Alimentação (letra V); Manutenção pessoal (independência e cuidado corporal – letra W); e, ainda, Higiene pessoal e banho (letra X). O manual é um guia curricular e um sistema de registro de habilidades para crianças com autismo e outros transtornos do desenvolvimento, com o intuito de indicar um planejamento para a aquisição de competências a partir das experiências cotidianas da pessoa avaliada, além de acompanhar a evolução das capacidades básicas, acadêmicas, de autoajuda e motoras(7).
Ressalta-se que a avaliação de estudantes com TEA é muito importante para conhecer as suas fragilidades e potencialidades e, a partir daí, traçar as metas e objetivos a serem alcançados. Por esta razão, a interação entre profissionais de saúde e da educação é crucial para um planejamento oportuno de ações direcionadas à criança e sua família, com vistas à aquisição e habilidades necessárias à vida independente. Neste ínterim, destaca-se a atuação de enfermeiros(as) atuantes na Atenção Básica, durante as consultas de acompanhamento do desenvolvimento infantil, por meio de instrumentos como a Caderneta da Criança, que fornece subsídios para detecção de alterações em marcos e auxilia na detecção de déficits importantes.
Nesse sentido, no quadro 01 evidenciam-se as Habilidades de Vestir-se, distribuídas em 15 itens (U1 a U15) referentes a Subir e descer as calças (U1); Calçar e tirar os sapatos (U2); Vestir e tirar uma camisa e um suéter (U3); Vestir e tirar uma camisa com botões (U4); Vestir e tirar as calças (U5); Vestir e tirar as meias (U6); Vestir e tirar a blusa de frio (U7); Abrir o zíper (U8); Fechar o zíper (U9); Usar um zíper na roupa (U10); Abotoar e desabotoar botões (U11); Usar broches (U12); Usar fivelas (U13); Ajustar a roupa quando necessário (U14); Amarrar cadarço dos sapatos (U15), como demonstrado no quadro 01 abaixo.
Quadro 01 - Dados referentes à avaliação de Habilidades de Vestir-se em estudantes no Espectro Autista de 5 a 15 anos, conforme a escala ABLLS-R. Balsas-MA, 2019.
Tarefas |
Estudantes de 5 a 10 anos N = 13 |
Estudantes de 11 a 15 anos N = 10 |
||||
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
|
U 1 – calças |
6 (26,1%) |
2 (8,7%) |
5 (21,7%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 2 – sapatos |
5 (21,7%) |
4 (17,4%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 3 – camisa |
4 (17,4%) |
5 (21,7%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 4 – botões |
6 (26,1%) |
3 (13,0%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 5 – calças |
5 (21,7%) |
3 (13,0%) |
5 (21,7%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 6 – meias |
5 (21,7%) |
4 (17,4%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 7 – blusas |
5 (21,7%) |
5 (21,7%) |
3 (13,0%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 8 – zíper |
6 (26,1%) |
4 (17,4%) |
3 (13,0%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
U 9 – zíper |
6 (26,1%) |
3 (13,0%) |
4 (17,4%) |
2 (8,7%) |
1 (4,3%) |
7 (30,4%) |
U 10 – zíper |
7 (30,4%) |
2 (8,7%) |
4 (17,4%) |
2 (8,7%) |
1 (4,3%) |
7 (30,4%) |
U 12 – broches |
10 (43,5%) |
- |
3 (13,0%) |
2 (8,7%) |
1 (4,3%) |
7 (30,4%) |
U 13 – fivelas |
7 (30,4%) |
3 (13,0%) |
3 (13,0%) |
2 (8,7%) |
1 (4,3%) |
7 (30,4%) |
U 14 – roupa |
6 (26,1%) |
2 (8,7%) |
5 (21,7%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
7 (30,4%) |
U 15 – cadarço |
9 (39,1%) |
1 (4,3%) |
3 (13,0%) |
2 (8,7%) |
3 (13,0%) |
5 (21,7%) |
Fonte: Pesquisa direta, 2019.
Conforme se observa, os resultados dão conta de que 7 (30,4%) estudantes não conseguem subir e descer as calças (U1) sozinhos, 3 (13,0%) conseguem com ajuda e 13 (56,5%) de modo independente. Relativo a calçar e tirar os sapatos (U2), 6 (26,1%) não realizam, 5 (21,7%) fazem com ajuda e 12 (52,2%) sem ajuda. Quanto a vestir e tirar uma camisa/suéter (U3), 5 (21,7%) não vestem/removem, 6 (26,1%) vestem com ajuda e 12 (52,2%) são independentes para a tarefa. Sobre vestir e tirar uma camisa com botões (U4), 7 (30,4%) não conseguem, 4 (17,3%) vestem/removem com ajuda e 12 (52,2%) conseguem de modo independente. Na habilidade U5 (vestir e tirar as calças), 6 (26,1%) estudantes não conseguem realizar, 4 (17,3%) realizam com ajuda e 13 (56,5%) são independentes. Referente a vestir e tirar as meias (U6), 6 (26,1%) não realizam, 5 (21,7%) fazem com ajuda e 12 (52,2%) sem ajuda.
Ainda quanto ao Quadro 1, na atividade U7 (vestir e tirar uma blusa de frio), verificou-se que 6 (26,1%) estudantes não conseguem, 6 (26,1%) fazem com ajuda e 11 (47,8%) realizam sozinhos. No que tange a tarefa U8 (abrir o zíper), 7 (30,4%) participantes conseguem, 5 (21,7%) fazem com ajuda e 11 (47,8%) conseguem sozinhos. Relativo a fechar o zíper (U9), percebeu-se que 8 (34,8%) não fecham, 4 (17,3%) fecham com ajuda e 11 (47,8%) fazem independente. Relativo a usar um zíper na roupa (U10), percebeu-se que 9 (39,1%) alunos não sabem usar, 3 (13,0%) usam com ajuda e 11 (47,8%) são independentes para a atividade.
Ressalta-se que a tarefa U11 (abotoar e desabotoar botões) não consta no Quadro, pois os escores eram diferentes das demais apresentadas e poderia confundir o leitor, entretanto, convém salientar que 10 (43,5%) estudantes não completaram a tarefa, obtendo escore zero, dos quais 8 menores de 10 anos e 2 de 11 a 15 anos. Concernente a tarefa U12 (usar broches), 12 (52,2%) alunos não a completam, 1 (4,3%) precisa de ajuda e 10 (43,4%) são independentes. Sobre usar fivelas (U13), 9 (39,1%) participantes não conseguem, 4 (17,3%) conseguem com ajuda e 10 (43,4%) são independentes. Quanto a tarefa U14 (ajustar a roupa quando necessário), 7 (30,4%) participantes não ajustam, 3 (13,0%) ajustam com ajuda e 12 (52,1%) ajustam sozinhos. Na última tarefa desta habilidade, amarrar o cadarço dos sapatos, 11 (47,8%) participantes não amarram, 4 (17,3%) amarram com ajuda e 8 (34,7%) amarram independentemente.
O Quadro 02 dispõe as habilidades de Comer (Alimentar-se), que estão divididas em 10 itens ou tarefas, caracterizadas na escala ABLLS-R com a consoante “V”- V1 a V10, referente a: Comer comida com a mão (V1); Beber usando canudo (V2); Beber do copo (V3); Comer de forma independente usando colher ou garfo (V4); Passar manteiga no pão (V5); Colocar suco no copo (V6); Cortar comida com a faca (V7); Ajudar a pôr a mesa (V8); Limpar a mesa depois de comer (V9); e ainda, Manter as áreas de comer limpas (V10), como segue no quadro 02.
Quadro 02 - Dados referentes à avaliação de Habilidades de Comer (alimentar-se) em estudantes no Espectro Autista de 5 a 15 anos, conforme a escala ABLLS-R. Balsas-MA, 2019.
Tarefas |
Estudantes de 5 a 10 anos N = 13 |
Estudantes de 11 a 15 anos N = 10 |
||||
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
|
V 1 – mão |
3 (13,0%) |
4 (17,4%) |
6 (26,1%) |
- |
- |
10 (43,5%) |
V 2 – canudo |
3 (13,0%) |
2 (8,7%) |
8 (34,8%) |
- |
1 (4,3%) |
9 (39,1%) |
V 3 – copo |
3 (13,0%) |
2 (8,7%) |
8 (34,8%) |
- |
- |
10 (43,5%) |
V 4 – colher |
4 (17,4%) |
2 (8,7%) |
7 (30,4%) |
- |
3 (13,0%) |
7 (30,4%) |
V 5 – manteiga |
7 (30,4%) |
3 (13,0%) |
3 (13,0%) |
1 (4,3%) |
3 (13,0%) |
6 (26,1%) |
V 6 – copo |
6 (26,1%) |
2 (8,7%) |
5 (21,7%) |
- |
1 (4,3%) |
9 (39,1%) |
V 7 – faca |
7 (30,4%) |
2 (8,7%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
2 (8,7%) |
7 (30,4%) |
V 8 – por mesa |
8 (34,8%) |
1 (4,3%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
6 (26,1%) |
3 (13,0%) |
V 9 – limpar mesa |
6 (26,1%) |
3 (13,0%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
7 (30,4%) |
2 (8,7%) |
V 10 – manter limpo |
5 (21,7%) |
4 (17,4%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
2 (8,7%) |
7 (30,4%) |
Fonte: Pesquisa direta, 2019.
Referente às habilidades de alimentação, percebe-se que das tarefas V1 à V4 e V6, somente os estudantes de 5 a 10 anos não conseguem realizar, sendo que 3 (13,0%) crianças, em cada tarefa, não realizam as atividades de comer com a mão, beber usando canudo e beber do copo e 4 (17,4%) não conseguem comer de forma independente usando colher ou garfo; além disso, 6 (26,1%) não colocam suco no copo. Nessa mesma linha de raciocínio, 4 (17,4%) e 2 (8,7%) estudantes, respectivamente, realizam as tarefas V1 e V3, com ajuda parcial.
Além disso, 16 (69,6%) estudantes completam a tarefa V1 de modo independente. Na tarefa V2 (beber usando canudo), 3 (13,0%) e 17 (73,9%) estudantes, respectivamente, bebem usando canudo com ajuda e de modo independente; além disso, 18 (78,3%) participantes bebem utilizando copo (V3) de maneira independente. Ao mesmo tempo, 5 (21,7%) estudantes comem usando colher ou garfo (V4) com ajuda e 14 (60,8%) comem sozinhas. Relativo à tarefa V5 (passar manteiga no pão), 8 (34,7%) participantes não conseguem passar, 6 (26,1%) passam com ajuda e 9 (39,1%) são independentes nesta atividade. Quanto a colocar suco no copo (V6), 3 (13,0%) e 14 (60,8%) alunos realizam com ajuda e independentemente, respectivamente.
No que tange a cortar a comida com a faca (V7), 8 (34,7%) estudantes não cortam, 4 (17,4%) cortam com ajuda e 11 (47,8%) sem ajuda. Na atividade V8 (ajudar a pôr a mesa), 9 (39,1%) estudantes não conseguem, 7 (30,4%) precisam de ajuda verbal ou gestual e 7 (30,4%) são independentes. No mais, 7 (30,4%) participantes não conseguem limpar a mesa depois de comer (V9), 10 (43,4%) limpam com ajuda e 6 (26,1%) limpam de maneira independente. Por fim, observa-se que 6 (26,1%) participantes não conseguem manter as áreas de comer limpas (V10), o mesmo quantitativo mantém com ajuda e 11 (47,8%) o fazem independentemente.
Quadro 03 - Dados referentes à avaliação de Habilidades de Manutenção Pessoal de estudantes no Espectro Autista de 5 a 15 anos, conforme a escala ABLLS-R. Balsas-MA, 2019.
Tarefas |
Estudantes de 5 a 10 anos N = 13 |
Estudantes de 11 a 15 anos N = 10 |
||||
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
|
W 1 – lavar mãos |
1 (4,3%) |
2 (8,7%) |
10 (43,5%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
W 2 – secar mãos |
1 (4,3%) |
5 (21,7%) |
7 (30,4%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
W 3 – lavar rosto |
4 (17,4%) |
5 (21,7%) |
4 (17,4%) |
1 (4,3%) |
2 (8,7%) |
7 (30,4%) |
W 4 – secar rosto |
4 (17,4%) |
3 (13,0%) |
6 (26,1%) |
1 (4,3%) |
2 (8,7%) |
7 (30,4%) |
W 5 – pentear cabelos |
4 (17,4%) |
2 (8,7%) |
7 (30,4%) |
1 (4,3%) |
3 (13,0%) |
6 (26,1%) |
W 6 – escovar dentes |
5 (21,7%) |
2 (8,7%) |
6 (26,1%) |
1 (4,3%) |
3 (13,0%) |
6 (26,1%) |
W 7 – assoar nariz |
1 (4,3%) |
5 (21,7%) |
7 (30,4%) |
1 (4,3%) |
2 (8,7%) |
7 (30,4%) |
Fonte: Pesquisa direta, 2019.
Concernente às Habilidades de Manutenção pessoal, que estão relacionadas às questões de higiene, limpeza e cuidados corporais, constatou-se que 2 (8,7%) estudantes não sabem lavar as mãos (W1), 3 (13,0%) lavam com ajuda e 18 (78,3%) lavam sozinhos. Sobre secar as mãos (W2), 2 (8,7%) participantes não sabem, 6 (26,1%) secam com ajuda e 15 (65,2%) secam sozinhas. Referente a atividade de lavar o rosto (W3), 5 (21,7%) não sabem lavar, 7 (30,4%) lavam com ajuda e 11 (47,8%) são independentes. No que tange a secar o rosto (W4), 5 (21,7%) estudantes não conseguem, 5 (21,7%) secam com ajuda e 13 (56,5%) secam independentemente; sendo que exatamente o mesmo ocorre em relação a tarefa W5 (pentear os cabelos). Quanto a escovar os dentes (W6), 6 (26,1%) não escovam, 5 (21,7%) escovam com ajuda e 12 (52,2%) escovam sozinhos. Na última tarefa (assoar o nariz), 2 (8,7%) não conseguem, 7 (30,4%) assoam com ajuda e 14 (60,8%) assoam sozinhos.
As Habilidades de Higiene Pessoal e Banho estão no Quadro 04, representadas pela letra “X” – X1 a X10 – que caracterizam: Urinar no vaso Sanitário (X1); Controlar a vontade de urinar (X2); Utilizar um banheiro conhecido para urinar (X3); Pedir para usar o banheiro quando necessário (X4); Limpar-se após urinar – sexo feminino - (X5); Defecar no vaso sanitário (X6); Controlar a vontade de defecar (X7); Limpar-se após defecar (X8); Utilizar um banheiro conhecido para defecar (X9); Usar o banheiro de forma independente (X10).
Quadro 04 - Dados referentes à pontuação em relação à Higiene Pessoal e Banho de estudantes no Espectro do Autismo de 5 a 15 anos, conforme a escala ABLLS-R. Balsas-MA, 2019.
Tarefas |
Estudantes de 5 a 10 anos N = 13 |
Estudantes de 11 a 15 anos N = 10 |
||||
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
Escore 0 N (%) |
Escore 1 N (%) |
Escore 2 N (%) |
|
X 3 – usar banheiro |
2 (8,7%) |
4 (17,4%) |
7 (30,4%) |
- |
- |
10 (43,5%) |
X 4 – pedir usar |
6 (26,1%) |
4 (17,4%) |
3 (13,0%) |
- |
2 (8,7%) |
8 (34,8%) |
X 5 – limpar-se |
2 (8,7%) |
1 (4,3%) |
- |
- |
3 (13,0%) |
3 (13,0%) |
X 7 – controlar def. |
4 (17,4%) |
4 (17,4%) |
5 (21,7%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
X 8 – limpar-se |
6 (26,1%) |
5 (21,7%) |
2 (8,7%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
X 9 – usar banheiro |
3 (13,0%) |
4 (17,4%) |
6 (26,1%) |
- |
- |
10 (43,5%) |
X 10 - independente |
8 (34,8%) |
3 (13,0%) |
2 (8,7%) |
1 (4,3%) |
1 (4,3%) |
8 (34,8%) |
Fonte: Pesquisa direta, 2019.
Em se tratando das Habilidades de higiene pessoal e banho, expostas no Quadro 04, incialmente, é preciso referir que três tarefas foram removidas da figura, já que as mesmas apresentavam escores de zero a quatro e não apenas até o 2, o que dificultaria a apresentação, as quais: Urinar no vaso sanitário (X1); Controlar a vontade de urinar (X2); e ainda, Defecar no vaso sanitário (X6), inclusive, destaca-se que na primeira tarefa (X1) apenas 2 (8,7%) estudantes não conseguem realizar; na segunda (X2), 4 (17,4%) não conseguem e na sexta (X6), 1 (4,3%) não realiza.
Quanto à tarefa X3 (Utilizar um banheiro conhecido para urinar), 2 (8,7%) não conseguem utilizar, 4 (17,4%) utilizam com ajuda e 17 (73,8%) são independentes. Relativo a pedir para usar o banheiro quando necessário (X4), 6 (26,1%) estudantes não pedem, 6 (26,1%) pedem mediante orientação/ajuda e 11 (47,8%) são independentes. A tarefa X5 (limpar-se após urinar), que é exclusiva para as pessoas do sexo feminino, foi observado que dentre as 9 meninas participantes do estudo, 2 (22,2%) não conseguem, 4 (44,4%) realizam com ajuda e 3 (33,3%) são independentes, sendo essas últimas maiores de 10 anos.
Relativo à tarefa X 7 (Controlar a vontade de defecar), 5 (21,7%) não controlam, 5 (21,7%) controlam parcialmente e 13 (56,5%) são independentes para essa atividade. No que tange a se limpar após defecar (X8), 7 (30,4%) não conseguem limpar, 6 (26,1%) limpam parcialmente e 10 (43,5%) limpam independentemente. Na tarefa X9 (Utilizar um banheiro conhecido para defecar), 3 (13,0%) estudantes não utilizam, 4 (17,4%) utilizam às vezes e 16 (69,6%) são independentes. Sobre usar o banheiro de forma independente (X10), constatou-se que 9 (39,1%) estudantes não usam, 4 (17,4%) usam com ajuda e 10 (43,5%) são independentes.
DISCUSSÃO
Constatou-se que a maioria dos estudantes que não conseguiu realizar as atividades de vestir-se está na faixa etária de 5 e 10 anos e, inclusive, todas são tarefas que crianças nestas idades cronológicas deveriam saber, já que se tratam de ações relativamente simples, mesmo para uma pessoa com alguma forma de atipia e, por isso, se ensinadas adequadamente, conseguiriam desempenhar. Destaca-se que o escore 0 (zero) – representando que o estudante não conseguiu realizar a tarefa – esteve presente na avaliação de todas as habilidades, mas, principalmente nas tarefas fechar o zíper, usar um zíper na roupa, usar broches, usar fivelas, e ainda, amarrar cadarço dos sapatos.
Ainda sobre os escores, observa-se que as habilidades demonstradas no quadro 01, exceto a “U11”, apresentam os valores 0, 1 e 2, e, comparando com a Teoria dos Sistemas de Orem, pode-se estabelecer ligação aos Sistemas Totalmente Compensatório (escore 0), Parcialmente Compensatório (escore 1) e Apoio educação (escore 2). Dessa maneira, cada uma dessas habilidades pode e deve ser ensinada aos estudantes, a partir da instrumentalização de enfermeiros, com base em Intervenções de Enfermagem aceitas mundialmente e, conforme a indicação das necessidades individuais dos referidos estudantes, já que as competências de autoajuda podem ser uma grande fonte de dificuldades para as crianças, adolescentes e adultos, uma vez que o ensino das mesmas pode proporcionar independência pessoal e autossuficiência.
A esse respeito, consta na NIC(2) importantes intervenções voltadas para as habilidades de vestir-se denominadas “Assistência no Autocuidado: vestir-se/arrumar-se”, que devem ser utilizadas pelos enfermeiros para auxiliar esse e outros grupos de pessoas na aquisição do autocuidado; feitas as devidas adequações, tais como: informar a disponibilidade de vestuário para seleção; disponibilizar as roupas em área acessível; orientar e manter a privacidade enquanto a pessoa estiver se vestindo; ensinar a colocar a roupa usada em local apropriado; ensinar e reforçar os esforços para vestir-se e remover a roupa e os calçados sozinho, utilizando um passo a passo para a tarefa, incluindo, quando necessário, o uso de pictogramas ou fotografias.
Conforme estudo(4), cada pessoa se desenvolve individualmente, de forma única na sociedade, por isso as condições e recursos que promovem o desenvolvimento natural das pessoas variam de acordo com o seio familiar, a comunidade e a sociedade que pertencem. Cada indivíduo, ao longo de sua vida, experimenta condições internas e externas que podem influenciar positiva ou negativamente o desenvolvimento, por esta razão, é essencial promover as melhores condições possíveis para que essas pessoas consigam efetivar seu autocuidado.
Ressalta-se que o nível de gravidade atribuído ao TEA é determinado pelo grau de autonomia e funcionamento da pessoa, sabendo-se que fatores como deficiência mental, hiperatividade e outros, podem comprometer o desenvolvimento cognitivo e limitar o potencial de prognóstico. Contudo, utilizando-se um método de aprendizagem individualizado e apoio consistente, a pessoa pode alcançar maiores níveis de autonomia ao longo da vida(8).
Sobre o assunto, os autores (9) destacam o uso de um sistema de ensino baseado em evidências científicas denominado TEACCH, que, traduzido do inglês, significa Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits Relacionados com a Comunicação, e basicamente tem como princípios que o ambiente organizado e o ensino estruturado, conseguem oferecer a crianças com alterações no desenvolvimento e comportamento uma idade adulta com o máximo de autonomia possível, a partir do ensino de habilidades essenciais.
Segundo estudo (10), crianças com TEA possuem dificuldades relacionadas à vida cotidiana como, por exemplo, vestir-se, amarrar cadarços, entre outras, dependendo da severidade dos sintomas do transtorno. Por isso, fomentar um currículo funcional é uma alternativa válida para o trabalho cotidiano com o estudante no Espectro Autista, pois as atividades que compõem esse documento agem como norte à capacitação desse indivíduo e de seus cuidadores para as práticas da vida, estimulando o estudante a sobrepor as dificuldades mais básicas e superá-las.
Consoante os autores (11), o cuidado direcionado a pessoas com um transtorno da identidade pessoal relacionado à fixação na fase pré-simbiótica do desenvolvimento, estimulação sensorial inadequada ou alterações neurológicas como o TEA, tem como benefícios ajudar a criança a reconhecer a separação durante atividade de cuidado pessoal como vestir-se e alimentar-se e ajudar a criança a aprender o nome das partes do corpo. Isso pode ser facilitado pelo uso de espelhos, desenhos e fotos da criança, e encorajar o contato físico apropriado dos outros e pelos outros.
Frisa-se que existem dois aspectos importantes do comportamento motor humano. O primeiro diz respeito à capacidade em produzir e sustentar uma ampla variedade de padrões de movimento e o outro é a habilidade de intencionalmente mudar estes padrões motores de acordo com as exigências ambientais. Conforme os autores(12), muitas das ações motoras diárias do indivíduo como abotoar uma camisa, fechar um zíper, colocar o cadarço no sapato, uma vez aprendidas, são realizadas com naturalidade e agilidade. Entretanto, quando a criança não consegue lidar com sucesso da prática dessas atividades ao mesmo tempo em que seus amigos, sua autoestima pode ser prejudicada, podendo acarretar em maiores dificuldades.
Quanto às habilidades de Comer (Alimentar-se), verificou-se que as tarefas que os estudantes não conseguiram realizar, incluindo aqueles entre 11 e 15 anos, foram: Passar manteiga no pão; Cortar comida com a faca; Ajudar a pôr a mesa; Limpar a mesa depois de comer; e, ainda, Manter as áreas de comer limpas. Convém salientar que muitas vezes as habilidades que envolvem a alimentação exigem a aquisição anterior de outras mais refinadas como a iniciativa, a capacidade de comunicação, mando e tato, bem como a aceitação de diferentes alimentos, texturas, cheiros e sabores.
Referente a NIC(2), apurou-se que existem nove grupos de intervenções que podem ser utilizadas pelos enfermeiros para o ensino do autocuidado as pessoas no Espectro Autista, as quais: “Aconselhamento Nutricional”, “Alimentação”, “Assistência no Autocuidado: alimentação”, “Controle da Nutrição”, “Controle de Distúrbios Alimentares”, “Ensino: Dieta Prescrita”, “Monitoração Nutricional”, e, “Terapia Nutricional”. Assim, os enfermeiros podem desenvolver as seguintes atividades, dentre outras: determinar os hábitos de consumo alimentar do paciente, facilitar a identificação de comportamentos alimentares a serem mudados, auxiliar na confecção e disponibilização de um guia alimentar atrativo ao estudante, discutir sobre o que o estudante gosta ou não de comer, avaliar o progresso das metas na modificação da dieta conforme apropriado, elogiar os esforços para atingir as metas, criar um ambiente adequado para a alimentação incluindo imagens com uma indicação do passo a passo de como colocar os alimentos no prato e se alimentar.
Inclui-se também: ensinar o uso de pratos e talheres, envolver o estudante nas escolhas dos alimentos, monitorar a capacidade de deglutição do estudante, fornecer assistência física conforme apropriado, propiciar a higiene oral antes e após as refeições, aconselhar o estudante a se alimentar na sala de jantar junto com a família, utilizar louças/utensílios apropriados as condições físicas e habilidades do estudante, fornecer estímulos a busca/solicitação dos alimentos, monitorar parâmetros fisiológicos, estabelecer rotina de pesagem, estimular o autocontrole da ingestão alimentar diária, encorajar o estudante a fazer uso de registros diários acerca das sensações relativas à ingestão alimentar, reunir-se rotineiramente com a equipe de saúde e familiares para avaliar a presença de distúrbios alimentares, orientar o estudante quanto ao nome dos alimentos, observar sinais de seletividade alimentar e ensinar aos cuidadores formas diferenciadas de uso e preparo dos alimentos, encaminhar o estudante ao nutricionista(2).
Diante disso, segundo estudo(13), os problemas de pessoas no Espectro Autista referentes a socialização podem atrapalhar no ato de comer, sobretudo, na presença de outras pessoas ou em grupo, tornando o aprendizado por imitação mais difícil. No entanto, quando não há fatores orgânicos identificáveis (distúrbios na motricidade orofacial, sensoriais ou gastrointestinais), a seletividade alimentar ou outros distúrbios, podem ser considerados manifestações dos interesses rígidos e restritos, característicos do comportamento autista.
Para a grande maioria das crianças comer é um dos momentos mais prazerosos e naturais, estando dependente de sua capacidade em processar as informações sensoriais, físicas, estruturais, suas habilidades e oportunidades oferecidas pelo ambiente. Porém, há crianças que possuem preferências alimentares, o que pode ser comum em crianças com desenvolvimento típico, mas em crianças com TEA essa preferência pode ser ainda mais restritiva e se prolongar até depois dos primeiros anos de vida(14).
Quanto a isso, aconselha-se escolher a colher de acordo com o tamanho do indivíduo e as comidas reforçadoras. O Encadeamento progressivo pode ser usado para ensinar e combinar cada um dos elementos (utensílios, alimentos, copo com água), no final, é necessário saber produzir a ação desejada. Esses comportamentos complexos precisam de uma maior estimulação manual e, às vezes, o uso da imitação mais de uma vez, até a aquisição da habilidade desejada(15).
A ação de enfermagem é fazer pelo outro o que o indivíduo não pode fazer por si mesmo. É uma propriedade complexa que exige educação e treinamento dentro de uma estrutura de uma relação interpessoal justificada. Nesse contexto da ação da enfermagem, o profissional tem a capacidade de auxiliar a pessoa, por essa razão, caso algum déficit de autocuidado seja identificado, a enfermagem pode utilizar de suas ações para a obtenção do autocuidado(4,5,12).
No que tange às Habilidades de Manutenção Pessoal, as mais prejudicadas nos estudantes foram: lavar e secar o rosto; pentear os cabelos; escovar os dentes; e, ainda, assoar o nariz. Salienta-se que algumas dessas habilidades são essenciais também como medidas protetivas à saúde, devendo ser ensinadas o mais precocemente possível e, inclusive, em tempos de doenças respiratórias como a COVID-19 que tem ceifado milhares de vidas em diversos países e causado sérios problemas nas economias de tais nações. Enfatiza-se que habilidades como a lavagem e higienização das mãos e corporal e cuidados com as secreções nasais são fundamentais para a prevenção dessa e de outras afecções transmissíveis por contato direto.
Para os autores(16), o estímulo e o reforço para o autocuidado devem estar presentes em diagnóstico de enfermagem como “Distúrbio da identidade pessoal relacionado a alterações neurológicas e risco para retardo relacionado a alterações neurológicas”. Dentre os cuidados elencados estão: auxiliar a criança em atividades básicas como alimentar-se e realizar higiene, ensinando-a como fazer e estimulando-a a realizar de acordo com a faixa etária; lembrar-se de elogiar o progresso da criança, incentivando-a e recompensando-a pelo bom trabalho, o que também é importante e deve fazer parte do cuidado.
Em relação a NIC(2), detectaram-se cinco grupos de intervenções voltadas para as habilidades de manutenção pessoal: “Cuidados com os Cabelos e Couro Cabeludo”; “Manutenção da Saúde Oral”; “Promoção da Saúde Oral”; “Restauração da Saúde Oral’; e, “Monitoração Respiratória”, além de diversos outros voltados para a nutrição/alimentação apresentados anteriormente. Assim, sobre as alterações nas habilidades de lavar e secar o rosto, serão apresentadas atividades no próximo grupo de habilidades, isto é, voltadas para o banho e higiene. No que tange a pentear os cabelos, podem ser utilizadas: orientar quanto à importância de manter os cabelos limpos e penteados, aplicar pequena quantidade de óleo ou creme para pentear conforme apropriado, escovar ou pentear os cabelos ensinado o passo a passo, monitorar a resposta do estudante quanto ao entendimento da importância de manter os cabelos arrumados, orientar quanto aos cuidados capilares.
Referente aos cuidados com os dentes, os enfermeiros podem orientar o estudante a estabelecer uma rotina de cuidados com a boca, identificar o risco para o desenvolvimento de estomatite, ensinar o passo a passo de escovação dos dentes gengiva e língua, encaminhar ao cirurgião dentista conforme apropriado, ensinar o estudante a monitorar as condições da boca. Referente ao ensino de assoar o nariz, os enfermeiros podem orientar quanto à necessidade de manter o nariz limpo, ensinar a utilizar o guardanapo de pano ou papel, orientar sobre onde e como a limpeza deve ser feita, observar quanto a alterações no processo respiratório e produção de muco, monitorar a capacidade do estudante em tossir e expelir secreções, ensinar o passo a passo de assoar o nariz.
Seguindo nessa mesma linha de intervenções, os autores(17) montaram um plano de cuidados para crianças com Autismo a partir de Diagnósticos de Enfermagem que focam nas maiores necessidades desses pacientes, incluindo o autocuidado, que é, conforme os autores, essencial para o seu desenvolvimento, inserção social e aprendizagem de habilidades necessárias para a independência.
O déficit de autocuidado pode ser evidenciado quando a demanda de autocuidado é superior a capacidade de se auto cuidar no que se refere à higienização do corpo, eliminações, solidão e interações sociais, prevenção de riscos, promoção da atividade humana, atividade e descanso, ingestão de água e alimentos, dentre outros. Nesse contexto, o enfermeiro identifica o déficit e intervém por meio dos métodos de ajuda, pois é quando as pessoas se tornam incapazes de cuidarem de si que a enfermagem aparece e providencia a assistência necessária(18-19).
No que tange às Habilidades de Higiene Pessoal e Banho, averiguou-se que as habilidades que a maioria dos estudantes não conseguiu realizar foram: Pedir para usar o banheiro quando necessário; Limpar-se após defecar; e Usar o banheiro de forma independente. De modo geral, o uso do banheiro é um grande empecilho às pessoas no Espectro Autista, pois é uma das habilidades mais difíceis de ser ensinada, já que envolve uma série de outras habilidades mais apuradas como, por exemplo, conhecer o próprio corpo, entender o momento de utilizar-se da capacidade de excretar resíduos alimentares, conseguir sentar no vaso, saber identificar o momento de defecar ou urinar; além dessa habilidade ser influenciada pela questão da escolha e aceitação dos alimentos e líquidos a serem ingeridos e, ainda, a capacidade fisiológica de ingerir/deglutir adequadamente os alimentos.
Assim, mediante a verificação, por parte dos enfermeiros, do tipo de dependência da pessoa no TEA em relação à execução de tais tarefas, se parcial ou total, é preciso traçar um plano de cuidados com base em intervenções que possam ser efetivas em auxiliá-la no aprendizado dessas habilidades que são essenciais para a independência e autonomia em diversas situações e ambientes e para toda a vida. Na NIC(2), existem, pelo menos, treze grupos de Intervenções voltadas para as Habilidades de Higiene Pessoal e Banho, as quais são: “Assistência no Autocuidado: Banho/Higiene”; “Assistência no Autocuidado: Uso de vaso sanitário”; “Banho”; “Controle da Demência: Banho”; “Controle da Eliminação Urinária: enurese”; “Cuidados na Retenção Urinária”; “Ensino: Treinamento dos Esfíncteres”; “Micção Induzida”; “Treinamento de Hábito Urinário”; “Treinamento Intestinal”; e, “Treinamento Vesical”.
Portanto, relacionado, especificamente, às três áreas mais acometidas nos estudantes participantes da pesquisa, que se referem, conforme supracitado, a pedir para usar o banheiro, limpar-se após defecar e usar o banheiro independentemente, os enfermeiros podem utilizar-se das atividades: considerar a idade de desenvolvimento do estudante para promover atividades de autocuidado relativas ao banho/higiene, facilitar o alcance e uso de utensílios de banho/higiene, monitorar a limpeza íntima, facilitar a manutenção de rotinas referentes ao momento do uso do banheiro, encorajar a participação dos pais/cuidadores nos rituais de higiene e uso do banheiro, fornecer assistência até o estudante conseguir assumir totalmente o autocuidado. Quanto ao uso do vaso sanitário, remover roupas essenciais para possibilitar a eliminação, ensinar como solicitar para usar o banheiro e o passo a passo a ser seguido, considerar a resposta do estudante à falta de privacidade, instituir esquema de higiene íntima após o uso do vaso, orientar a dar descarga após o uso do vaso e, também, monitorar a integridade da pele.
Os resultados deste estudo em relação às dificuldades na higiene e uso do banheiro são mais evidentes nos estudantes menores de 10 anos, no entanto, o impacto dessas habilidades no desenvolvimento envolve também os estudantes de 11 a 15 anos. Os autores(20) observaram frutos semelhantes em seu estudo, mais especificamente em relação à adolescência e relatam problemas no relacionamento dos filhos com as mães, causados, principalmente, por distúrbios comportamentais e pela dificuldade com a comunicação. Além disso, outro aspecto observado pelos autores e que confirma os achados desta pesquisa, refere-se às tarefas de higiene que passam a ser ainda mais desafiadoras e complexas para os pais, pois o filho já possui estatura de adulto, porém, ainda não tem autonomia para lidar com tarefas básicas envolvendo seu próprio corpo.
O estudo(15) refere que é comum crianças com autismo precisarem de ajuda de adultos para realizarem tarefas básicas, porém, é possível que aprendam habilidades de autoajuda bastante complexas. Neste sentido, no desenvolvimento das habilidades de autoajuda, devem-se utilizar de procedimentos de modelagem e encadeamento de generalização, buscando reforçar as aproximações da resposta alvo. Quando necessário, as habilidades são estimuladas fisicamente, guiando o indivíduo pelos movimentos desejados ou, então, pela demonstração dos comportamentos. Se existe a capacidade de imitação, utiliza-se de estímulos de demonstração, por exemplo.
Logo, os enfermeiros(as), sobretudo aqueles que atuam na Atenção Básica, podem e devem munir-se de conhecimentos técnico-científicos capazes de orientar pais/mães/cuidadores e às próprias pessoas com TEA, conforme o nível de entendimento, a desenvolverem habilidades de autoajuda por meio do uso de imagens, fotos e pictogramas, além de materiais concretos com vistas a aplicar os saberes apreendidos na vida cotidiana, quer por meio de atividades básicas funcionais, acadêmicas ou na socialização.
As limitações deste estudo puderam estar no grupo de estudantes, por pertencer exclusivamente a um município de médio porte do nordeste brasileiro, o que poderia dificultar a projeção dos resultados a outras pessoas com TEA, além de o instrumento não ser de uso corriqueiro, sobretudo no sistema público de educação e menos ainda da saúde.
CONCLUSÕES
A atenção a pessoas no Espectro Autista constitui um grande desafio para o sistema e profissionais de saúde, mas pode encontrar na Enfermagem uma aliada, não apenas na instituição de Intervenções apropriadas às necessidades individuais, mas e, sobretudo, no ensino de habilidades de autocuidado essenciais à autonomia. Busca-se uma série de benefícios que incluem melhorias nas interações sociais, assim como nos contextos educativos e nas atividades de manutenção pessoal.
Com base na análise realizada, pode-se concluir que dentre os quatro grupos de habilidades de autoajuda investigadas em estudantes no Espectro Autista, as atividades de vestir-se e comer/alimentar-se foram as mais atingidas, inclusive, em participantes acima de 11 anos. Notou-se ainda, que a Teoria do Déficit de Autocuidado proposta por Orem tem uma relevante importância e pode ser aplicável a indivíduos no TEA, apresentando um elevado potencial para influenciar ações de enfermagem diretamente relacionadas às fragilidades detectadas em pessoas nessa condição.
Para mais, ficou claro que na Classificação das Intervenções de Enfermagem (NIC) existem diversos grupos de intervenções capazes de propiciar às pessoas com TEA uma assistência que busque atender às necessidades funcionais, de autocuidado e oferecer requisitos à aquisição de autonomia, além de incluir estratégias que reforçam a obtenção do autoconhecimento, autocontrole e a participação ativa dessas pessoas no próprio cuidado.
Sugere-se que os enfermeiros se apropriem desses conhecimentos para, durante as consultas e atendimentos de acompanhamento do crescimento e desenvolvimento, avaliarem a presença de sinais e sintomas comuns do TEA, e, a partir da identificação de fragilidades e potencialidades, realizem intervenções mais significativas.
Outrossim, é essencial acompanharem e auxiliarem as famílias, ensinando-as a desenvolverem o autocuidado de seus filhos/membros no espectro, pois é muito angustiante perceberem que suas crianças não conseguem desenvolver habilidades funcionais e de autoajuda, sendo crucial encorajá-los, transmitindo-lhes tranquilidade, minimizando dúvidas, bem como incentivando uma terapêutica multiprofissional, com vistas a alcançar um prognóstico compatível com uma vida de independência pessoal, financeira, acadêmico-profissional e social.
REFERÊNCIAS
10. Suplino MHFO. Ensinando a pessoas com Autismo e deficiência intelectual. 1. ed. Rio de Janeiro: Diferenças; 2011.
Financiamento Próprio
Contribuição dos autores
Todos os autores contribuíram na concepção e no planejamento do estudo; 2. na obtenção, na análise e interpretação dos dados; 3. assim como na redação e revisão crítica e aprovação final da versão publicada.
Editor Científico: Ítalo Arão Pereira Ribeiro. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-0778-1447