ARTIGO ORIGINAL

 

ADESÃO MEDICAMENTOSA DE HIPERTENSOS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: INFLUÊNCIA DOS HÁBITOS DE VIDA

 

MEDICATION ADHERENCE FOR HYPERTENSIVE PEOPLE IN PRIMARY HEALTH CARE: INFLUENCE OF LIFESTYLE HABITS

 

ADHERENCIA A LA MEDICACIÓN DE PACIENTES HIPERTENSOS EN ATENCIÓN PRIMARIA DE SALUD: INFLUENCIA DE LOS HÁBITOS DE VIDA

 

https://doi.org/10.31011/reaid-2025-v.99-n.supl.1-art.2278

 

Mara Dayanne Alves Ribeiro1

Francisco Rauan de Moraes Ferreira2

Adriano da Costa Belarmino3

Kamyla de Arruda Pedrosa4

Antônio Diego Costa Bezerra 5

Francisco José Maia Pinto6

 

1 Universidade Estadual do Ceará, Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, Fortaleza-CE, Brasil, https://orcid.org/0000-0003-0756-1428.

2 Faculdade Ieducare – FIED, Tianguá-CE, Brasil,  https://orcid.org/0009-0003-2750-695X.

3 Universidade Estadual do Ceará, Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, Fortaleza-CE, Brasil, https://orcid.org/my-orcid?orcid=0000-0003-4401-9478

4 Universidade Estadual do Ceará, Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, Fortaleza-CE, Brasil,  https://orcid.org/0000-0001-5675-8097

5 Universidade Estadual do Ceará, Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, Fortaleza-CE, Brasil, https://orcid.org/0000-0002-2441-2961

6 Universidade Estadual do Ceará, Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, Fortaleza-CE, Brasil, https://orcid.org/0000-0003-2976-7857

 

Autor correspondente

Mara Dayanne Alves Ribeiro

Av. Dr. Silas Munguba, 1700 - Parangaba, Fortaleza – CE, Brasil. 60714-242, Telefone: +55(85) 3101-9827, E-mail: mara.dayanne@aluno.uece.br.

 

RESUMO

INTRODUÇÃO: A terapia para a Hipertensão Arterial Sistêmica consiste no controle medicamentoso e na adoção de hábitos de vida saudáveis para a manutenção de padrões aceitáveis de pressão arterial. OBJETIVO: analisar a adesão medicamentosa de hipertensos atendidos na atenção primária a partir da influência dos hábitos de vida. MÉTODO: Trata-se de um estudo transversal, descritivo e analítico, realizado com usuários hipertensos, em uma cidade do Ceará, Brasil. A coleta de dados deu-se por questionário próprio e pelo Teste de Morisky-Green. RESULTADOS: Ao todo, foram entrevistados 91 indivíduos, onde a maioria não aderiu ao tratamento para hipertensão adequadamente (n=79; 86,8%), é do sexo feminino (n=47; 51,6%), com companheiro(a) (n=65; 71,4%), ensino fundamental completo (n=66; 72,5%), e possuía renda menor que um salário mínimo (n=69; 75,8%). Foram encontradas associações significativas, no modelo não ajustado com p<0,02, para as características sexo (p=0,173), escolaridade (p=0,143) e histórico de tabagismo (p=0,014). CONCLUSÃO: Não foi possível constatar associação entre adesão medicamentosa e hábitos de vida, entretanto, é fundamental o acompanhamento adequado desses indivíduos, a fim de auxiliar os profissionais de saúde na elaboração de ações de controle, que estimulem os hipertensos na compreensão e conhecimento sobre a doença e a terapêutica adotada.

Palavras-chave: Hipertensão Arterial; Terapia Medicamentosa; Estilo de Vida.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Therapy for Systemic Arterial Hypertension consists of medication control and the adoption of healthy lifestyle habits to maintain acceptable blood pressure standards. OBJECTIVE: to analyze medication adherence of hypertensive patients treated in primary care based on the influence of lifestyle habits. METHOD: This is a cross-sectional, descriptive and analytical study, carried out with hypertensive users, in a city in Ceará, Brazil. Data collection took place using a specific questionnaire and the Morisky-Green Test. RESULTS: In total, 91 individuals were interviewed, the majority of whom did not adhere to hypertension treatment adequately (n=79; 86.8%), were female (n=47; 51.6%), with a partner (n=65; 71.4%), completed primary education (n=66; 72.5%), and had an income lower than the minimum wage (n=69; 75.8%). Significant associations were found, in the unadjusted model with p<0.02, for the characteristics gender (p=0.173), education (p=0.143) and smoking history (p=0.014). CONCLUSION: It was not possible to verify an association between medication adherence and lifestyle habits, however, adequate monitoring of these individuals is essential in order to assist health professionals in developing control actions that encourage hypertensive patients to understand and know about the disease and the therapy adopted.

Keywords: Arterial hypertension; Drug therapy; Lifestyle.

 

RESUMEN

INTRODUCCIÓN: La terapia de la Hipertensión Arterial Sistémica consiste en el control de la medicación y la adopción de hábitos de vida saludables para mantener estándares aceptables de presión arterial. OBJETIVO: analizar la adherencia a la medicación de pacientes hipertensos atendidos en atención primaria en función de la influencia de los hábitos de vida. MÉTODO: Se trata de un estudio transversal, descriptivo y analítico, realizado con usuarios hipertensos, en una ciudad de Ceará, Brasil. La recogida de datos se realizó mediante un cuestionario específico y el test de Morisky-Green. RESULTADOS: En total, fueron entrevistados 91 individuos, la mayoría de los cuales no adhirieron adecuadamente al tratamiento de la hipertensión (n=79; 86,8%), eran mujeres (n=47; 51,6%), con pareja (n= 65; 71,4%), educación primaria completa (n=66; 72,5%) y ingresos inferiores al salario mínimo (n=69; 75,8%). Se encontraron asociaciones significativas, en el modelo no ajustado con p<0,02, para las características género (p=0,173), educación (p=0,143) e historial de tabaquismo (p=0,014). CONCLUSIÓN: No fue posible verificar asociación entre adherencia a la medicación y hábitos de vida, sin embargo, el seguimiento adecuado de estos individuos es fundamental para ayudar a los profesionales de la salud a desarrollar acciones de control que alienten al paciente hipertenso a comprender y conocer la enfermedad y la terapia adoptada.

Palabras clave: Hipertensión Arterial; Terapia Farmacológica; Estilo de Vida.

 

INTRODUÇÃO

A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) é considerada um problema de saúde pública no Brasil e no mundo devido à carga de complicações provenientes de sua cronicidade: acidentes vasculares encefálicos, insuficiência cardíaca, infarto agudo do miocárdio, insuficiência renal, entre outras. Clinicamente, é identificada pela elevação crônica de níveis pressóricos (sistólica ≥140mmhg e diastólica ≥90 mmhg)(1, 2, 3).

No Brasil, a Pesquisa Nacional de Saúde realizada em 2019 estimou que cerca de um quarto da população adulta brasileira teria hipertensão arterial, com prevalência autorreferida de 23,9%, obtendo destaque em mulheres, com associação às faixas etárias mais elevadas, raça/cor da pele preta e parda, baixa escolaridade, consumo elevado de sal e ex-tabagista(4). Ainda, associa-se a essa problemática a baixa adesão à terapia da doença, que consiste em controle medicamentoso combinado a adoção de hábitos saudáveis de vida(3).

O tratamento é fornecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) através da Atenção Primária à Saúde (APS), onde são dispensados medicamentos (Farmácia Básica), consultas e orientações(4,5). Além disso, para atuar sobre a baixa adesão ao tratamento da HAS, a APS trabalha com ações programadas para grupos de indivíduos Hipertensos e Diabéticos (HIPERDIA), cujo objetivo é o acompanhamento de pacientes portadores de Hipertensão e/ou Diabetes adscritos em uma Unidade Básica de Saúde (UBS). Com isso, tem-se a intenção de gerar informação sobre a doença e sua terapia, por meio de ações de educação em saúde que focam nos fatores de risco ditos modificáveis, para a prevenção de complicações da doença, como etilismo, tabagismo, dislipidemia e obesidade(6,7).

A HAS não tem cura, mas tem tratamento e pode ser controlada, e é este o fator que diminui as complicações, e, consequentemente a mortalidade, associada à doença(5). Além disso, reduz os custos por internações hospitalares e melhora a qualidade de vida das pessoas acometidas(3,8).

Entretanto, a adesão medicamentosa ao tratamento da HAS ainda é bastante irregular, por isso, busca-se identificar fatores que influenciam para essa baixa adesão. Ademais, considerando-se a interferência dos hábitos de vida tanto na prevenção da doença, como em suas complicações, busca-se elucidar sua influência também na adesão ao tratamento medicamentoso, a fim de fomentar estratégias de saúde mais eficazes no manejo desse problema de saúde comum da atualidade(9,10).

Assim, o objetivo desta pesquisa foi analisar a adesão medicamentosa de hipertensos atendidos na APS a partir da influência dos hábitos de vida.

 

MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa transversal, descritiva e analítica, realizada no Município de São Benedito-CE, Brasil, em 2023.

O município de São Benedito está localizado na Serra da Ibiapaba, com população registrada de 47.640 pessoas, no último censo. Faz parte da Área Descentralizada de Saúde (ADS) de Tianguá-CE, sendo o segundo maior município desta região, em número de habitantes e em número de profissionais de nível superior na atenção à saúde. Dentre estes, consta com a segunda maior presença de médicos de família na APS, o que justificou a escolha deste local para a pesquisa(11,12).

A UBS pesquisada foi escolhida por conveniência, e engloba n=1886 (100%) habitantes adscritos, destes n=211 (11,2%) são hipertensos, sendo n=172 (81,5%) acompanhados rotineiramente na Unidade que constituíram a população deste estudo.

Como critérios de inclusão foram considerados: usuários com HAS cadastrados na UBS; com diagnóstico médico há mais de um ano; fazer uso de medicamento para tratamento de HAS; idade igual ou superior a 18 anos; de ambos os sexos. Excluíram-se pessoas com déficit cognitivo, acamadas ou ainda dependente de cuidadores, e, aquelas com diagnóstico de HAS secundária.

A coleta de dados aconteceu na farmácia da UBS em questão, no momento da dispensação do tratamento medicamentoso aos usuários. Inicialmente, ocorreu uma apresentação dos objetivos da pesquisa, no qual foi apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) aos participantes, em um ambiente tranquilo e privativo, solicitando-os em caso de concordância, suas assinaturas, e garantindo-lhes a preservação de seu anonimato. Após isso, procedeu-se com a entrevista estruturada conforme instrumento adaptado da caderneta da pessoa idosa do Ministério da Saúde (MS), que abordou características sociais, demográficas e clínicas dos participantes. Em seguida, aplicou-se o Teste de Morisky-Green (TMG) para qualificar a adesão medicamentosa ao tratamento da HAS.

O TMG é composto por quatro perguntas para identificar atitudes e comportamentos frente à tomada de medicamentos, e que se tem mostrado útil para a identificação de pacientes aderentes   ou   não   ao   tratamento medicamentoso. De   acordo   com   o protocolo do TMG, é considerado aderente ao tratamento o paciente que obtém pontuação máxima de quatro pontos e não aderente o que obtém três pontos ou menos no teste(13). Com isso, a amostra foi dividida em dois grupos: aderentes e não aderentes a terapia medicamentosa para HAS.

As variáveis utilizadas nesse estudo foram: adesão medicamentosa no tratamento da HAS (categorizadas como inadequada e adequada, a partir do TMG); caracterização  sociodemográfica (sexo, escolaridade, saber ler/escrever, raça/cor, renda e estado civil); existência de comorbidades (diabetes mellitus, doença arterial coronariana, doença renal crônica); quantidade de medicamentos ingeridos diariamente (mais de dois medicamentos diários; até dois medicamentos diários); hábitos de vida (prática regular de atividade física, adoção de dieta equilibrada, uso de álcool e tabagismo).

Os dados oriundos dos questionários foram tabulados no Programa Microsoft Excel v.13.0, e tratados no Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 23.0. A análise descritiva foi realizada através de frequências absolutas e percentuais. Enquanto para a análise inferencial utilizou-se como desfecho a adesão e a não adesão medicamentosa. Para isso, utilizou-se o teste do Qui-quadrado ou teste da razão de verossimilhança, modelo não ajustado. As variáveis analisadas no modelo ajustado foram as com . Para determinar o modelo ajustado utilizou-se regressão de Poisson com estimador robusto e a estatística de Wald. Para testar a significância do modelo ajustado final utilizou-se o teste de Omnibus, considerando-se significativo o p<0,05.

A pesquisa foi previamente aprovada pelo Comitê de Ética em do Centro Universitário Inta - UNINTA sob parecer 6.058.599. Além disso, foram respeitados os princípios éticos da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e da Declaração de Helsinki, 2008.

 

RESULTADOS

A pesquisa foi realizada com 91 indivíduos em tratamento por HAS do Município de São Benedito-CE, onde a maioria desses: não aderiu ao tratamento para HAS de forma adequada (n=79; 86,8%), foi do sexo feminino (n=47; 51,6%), com companheiro(a) (n=65; 71,4%), ensino fundamental completo (n=66; 72,5%), sabia ler e escrever (n=77; 84,6%) e possuía renda menor do que um salário mínimo (n=69; 75,8%). Além disso, a maior parte deles era da raça/cor parda (n=25; 27,5%) (Tabela 1).

 

Tabela 1 - Número e percentual de indivíduos hipertensos, cadastrados na UBS de São Benedito-CE, por tipo de adesão medicamentosa e variáveis preditoras, em 2023.

Variável

n

%

Adere ao tratamento

 

 

Inadequada

79

86,8

Adequada

12

13,2

Sexo

 

 

Masculino

44

48,4

Feminino

47

51,6

Raça/Cor

 

 

Preta

24

26,4

Parda

25

27,5

Branca

24

26,4

Não declarada

18

19,8

Estado Civil

 

 

Sem companheiro(a)

26

28,6

Com companheiro(a)

65

71,4

Escolaridade

 

 

Não Alfabetizado

8

8,8

Fundamental

66

72,5

Médio

17

18,7

Saber ler e escrever

 

 

Não

14

15,4

Sim

77

84,6

Renda(s.m.)

 

 

< 1

69

75,8

> 1

22

24,2

Fonte: Própria.

 

 

 

Da análise das variáveis clínicas e hábitos de vida observados, a maioria dos hipertensos pesquisados tomou até dois medicamentos por dia (n=88; 96,7%), não praticava atividade física (n=71; 78,0%), não adota dieta equilibrada (n=80; 87,9%), não tem histórico de tabagismo (n=72; 79,1%) e não tem histórico de etilismo (n=79; 86,8%), sendo predominante a ausência de comorbidades (n=45; 49,5%) (Tabela 2).

 

Tabela 2 - Número e percentual de habitantes pesquisados, cadastrados na UBS de São Benedito-CE, por variáveis clínicas e hábitos de vida, em 2023.

          Variável

n

%

 

Presença de comorbidades

 

 

 

Diabetes mellitus

39

42,9

 

DAC/Doença renal crônica

7

7,7

 

Não possui

45

49,5

 

Quantidade de medicamentos (por dia)

 

 

 

Mais de dois

3

3,3

 

Até dois

88

96,7

 

 

Prática de atividade física

 

 

 

 

      Não

71

78,0

 

      Sim

20

22,0

 

     Adota dieta equilibrada

 

 

 

      Não

80

87,9

 

 

      Sim

11

12,1

 

 

    Histórico de tabagismo

 

 

 

 

      Sim

19

20,9

 

 

      Não

72

79,1

 

 

    Histórico de etilismo

 

 

 

 

     Sim

12

13,2

 

 

    Não

79

86,8

 

                     Fonte: Própria.

 

Na verificação de existência de associação significativa da adesão ao tratamento com as variáveis sociodemográficas, com p0,2, modelo não ajustado, foram significativas as características sexo(p=0,173) e escolaridade (p=0,143) (Tabela 3).

Tabela 3 - Número e percentual de hipertensos, cadastrados na UBS de São Benedito-CE, análise por modelo não ajustado paras variáveis sociodemográficas e por adesão ao tratamento, em 2023.

 

Adesão ao tratamento

 

 

 

 

 

 

Inadequada

Adequada

 

 

 

 

 

 

n

%

n

%

RP

IC 95%

 

p

 

Sexo

 

 

 

 

 

 

 

0,173

a

Masculino

36

81,8

8

18,2

0,9

0,8

1,1

 

 

Feminino

43

91,5

4

8,5

1,0

 

 

 

 

Escolaridade

 

 

 

 

 

 

 

0,143

b

Não Alfabetizado

8

100,0

0

0,0

1,1

0,9

1,2

 

 

Fundamental

55

83,3

11

16,7

0,9

0,8

1,0

 

 

Médio

16

94,1

1

5,9

1,0

 

 

 

 

Saber ler e escrever

 

 

 

 

 

 

 

0,437

b

Não

13

92,9

1

7,1

1,1

0,9

1,3

 

 

Sim

66

85,7

11

14,3

1,0

 

 

 

 

Raça/Cor

 

 

 

 

 

 

 

0,295

b

Preta

18

75,0

6

25,0

0,8

0,6

1,1

 

 

Parda

23

92,0

2

8,0

1,0

0,8

1,3

 

 

Branca

22

91,7

2

8,3

1,0

0,8

1,3

 

 

Não declarada

16

88,9

2

11,1

1,0

 

 

 

 

Renda(s.m.)

 

 

 

 

 

 

 

0,943

b

< 1

60

87,0

9

13,0

1,0

0,8

1,2

 

 

> 1

19

86,4

3

13,6

1,0

 

 

 

 

a - Qui-quadrado                      b – Razão de verossimilhança

Fonte: Própria.

 

No modelo não ajustado de adesão ao tratamento com as variáveis clínicas, não foram identificadas variáveis significativas (p0,2). Ao se analisar a adesão ao tratamento com os hábitos de vida, no modelo não ajustado, observou-se associação significativa apenas para a variável histórico de tabagismo(p=0,014) (Tabela 4).

 

 

 

Tabela 4 - Número e percentual de habitantes pesquisados, cadastrados na UBS de São Benedito-CE, por variáveis dos hábitos de vida e por adesão ao tratamento, em 2023.

 

Adesão ao tratamento

 

 

 

 

 

 

Inadequada

Adequada

 

 

 

 

 

 

n

%

n

%

RP

IC 95%

 

p

 

Prática de atividade física

 

 

 

 

 

 

 

0,328

b

Não

63

88,7

8

11,3

1,1

0,9

1,4

 

 

Sim

16

80,0

4

20,0

1,0

 

 

 

 

Adota dieta equilibrada

 

 

 

 

 

 

 

0,616

b

Não

70

87,5

10

12,5

1,1

0,8

1,4

 

 

Sim

9

81,8

2

18,2

1,0

 

 

 

 

Histórico de tabagismo

 

 

 

 

 

 

 

0,014

b

Sim

19

100,0

0

0,0

1,2

1,1

1,3

 

 

Não

60

83,3

12

16,7

1,0

 

 

 

 

Histórico de etilismo

 

 

 

 

 

 

 

0,574

b

Sim

11

91,7

1

8,3

1,1

0,9

1,3

 

 

Não

68

86,1

11

13,9

1,0

 

 

 

 

b – Razão de verossimilhança

Fonte: Própria.

 

No modelo ajustado o teste de Omnibus não foi significativo, p=0,496, para as variáveis com p<0,2 nas etapas anteriores.

DISCUSSÃO

Nesta pesquisa verificou-se que não houve adesão ao tratamento medicamentoso para HAS, resultado corroborado pela literatura(14-16). A adesão medicamentos para a HAS apresenta-se como resultado de múltiplas influências: quantidade de medicamentos ingerida, apoio social, vínculo frágil com a estratégia de saúde, nível de conhecimento sobre a doença, dentre outras(17). Com tudo isso, ressalta-se a necessidade de empoderamento da pessoa diagnosticada, com meios que assegurem seu direito ao acesso à serviços de saúde de modo equânime e universal. Devido a HAS ser uma doença crônica, muitas vezes, associada a complicações, necessitar de tratamento contínuo e que exige habilidades como pontualidade na administração, identificação e dosagem corretas. Há cada vez mais, a necessidade de introdução de outros fatores que considerem não somente o comportamento individual, mas elementos culturais, sociais, econômicos que influenciam os hábitos de vida e adesão medicamentosa.

A presença de associação significativa entre a não adesão medicamentosa e a escolaridade encontra-se fundamentada em pesquisas onde indivíduos não aderentes também apresentaram maior dificuldade em ler os rótulos e lembrar de tomar a medicação corretamente. Assim, considera-se que um melhor letramento em saúde esteve associado à melhores resultados de adesão ao tratamento medicamentoso da hipertensão arterial(16,18). Associa-se que o analfabetismo e a baixa escolaridade prejudiquem a compreensão da doença e de seus mecanismos de controle, reduzindo a independência do doente, nesse contexto.

A hipertensão arterial é comumente apresentada entre mulheres de faixas etárias mais elevadas, pretas e pardas e com baixa escolaridade(4). Estes dados coincidem com os resultados deste estudo, onde acrescentamos que a maioria da amostra possui também uma renda inferior a um salário mínimo. Ressalta-se ainda a relação entre as características sociodemográficas de uma população e as condições de saúde desta, tais como: acesso e procura pelos serviços de saúde, grau de informação sobre a doença, e consequente adesão ao tratamento da mesma.

O tratamento para a HAS normalmente é composto pela medicação mais a adoção de hábitos de vida saudáveis como padrão alimentar baixo em sódio, controle de peso, prática de atividade física, e controle de estresse, o que também colabora para evitar complicações da doença(3). Embora, nesse estudo não tenha sido encontrada associação entre os hábitos de vida e a adesão medicamentosa, faz-se necessária uma certa atenção a esse ponto, pois as mudanças realizadas no cotidiano interferem no sucesso do tratamento da HAS e influenciam na decisão do paciente de possuir constância à terapêutica(19). Em nossa amostra, a maioria dos indivíduos não pratica atividade física e relata não adotar dieta equilibrada, o que nos leva a afirmar que não há, também, adesão ao tratamento não farmacológico para a HAS, estando esta situação associada à outra. Destarte, o que sustenta a hipótese de que indivíduos que mantém hábitos saudáveis de vida possuem maiores cuidados com sua saúde, aderindo corretamente aos tratamentos propostos.

Muitas vezes, é a falta de informação desses indivíduos sobre a HAS que faz com que eles não se comprometam com o tratamento. A ESF precisa ir além da dispensação medicamentosa e elaborar estratégias de educação em saúde que levem em conta as perspectivas e significações do usuário sobre a doença, pois, sabe-se que as crenças do indivíduo também ocasionam mudanças em sua vida cotidiana(20,21). Além disso, é comum, para essas pessoas, a incredulidade no poder de se obter melhora em sua situação de saúde com mudanças em seu estilo de vida, o que aumenta o risco de complicações pela falta de compreensão das informações.

Aliado a esse contexto, para alguns indivíduos a hipertensão é uma doença assintomática, não sendo diagnosticada e tratada adequadamente(3,22). Assim, não sendo evidenciados os sintomas da doença, os pacientes acreditam não necessitar de cuidados com a saúde, por sentirem-se saudáveis. Acrescenta-se a isso que com a consciência do controle pressórico adequado e do seguimento correto no tratamento serão evitadas as complicações da HAS, melhorando a qualidade e a expectativa de vida desses indivíduos.

O estudo contribuiu para a identificação de características e comportamentos relacionados a não adesão ao tratamento de HAS, possibilitando direcionar as ações a este público a fim de fomentar a aderência efetiva ao tratamento. Destaca-se também, a necessidade de discutir a importância da adoção dos hábitos saudáveis como estratégia não farmacológica de tratamento e preditora de um melhor prognóstico.

Entre as limitações dessa pesquisa descreve-se a realização de entrevistas em um único encontro com os participantes, o que pode não representar a real condição do usuário. Além disso, por basear-se em respostas autorreferidas, os resultados podem sofrer interferência da memória. Por fim, acredita-se que o tamanho da amostra mais a estratégia de conveniência para a coleta dos dados possam ter influenciado nos dados obtidos ao se analisar as variáveis no modelo ajustado.

 

CONCLUSÕES

Os resultados apontam para uma maioria de indivíduos que não aderiu ao tratamento medicamentoso para HAS de forma adequada, não praticava atividade física e não adotava dieta saudável, como medidas colaborativas ao controle da doença. Ainda assim, não se constatou associação entre adesão medicamentosa e hábitos de vida. Entretanto, sabe-se que essas variáveis influenciam diretamente no manejo de indivíduos hipertensos e compõem o tratamento não medicamentoso da doença, sendo fundamental o seu acompanhamento.

Com isso, recomenda-se a realização de novas pesquisas com amostra maior, estratificada, de forma a obter participantes de diversas UBS para maior comparabilidade dos resultados. No entanto, também destacamos que a análise dos fatores intervenientes na adesão medicamentosa de pacientes hipertensos contribui para compreender e desenvolver estratégias de promoção da adesão, de hábitos de vida, de salutogênese de indivíduos e comunidades. Ainda, nssos resultados estimulam os profissionais de saúde a elaborarem ações que promovam a compreensão e o conhecimento correto sobre a doença e a terapêutica adotada, favorecendo uma atitude participativa dos indivíduos hipertensos em seu tratamento.

 

REFERÊNCIAS

1.         Zangirolani LTO, et al. Self-reported hypertension in adults residing in Campinas, Brazil: prevalence, associated factors and control practices in a population-based study. Ciência Saúde Coletiva. 2018;23:1221-32, DOI: 10.1590/1413-81232018234.16442016.

2.         Perini W, et al. Ethnic disparities in treatment rates for hypertension and dyslipidemia: An analysis by different treatment indications: The Healthy Life in an Urban Setting study. J Hypertens. 2018;36(7):1540-1547, DOI: 10.1097/HJH.0000000000001716

3.         Barroso WKS, Rodrigues CIS, Bortolotto LA, Mota-Gomes MA, Brandão AA, Feitosa ADM, et al. Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial – 2020. Arq Bras Cardiol. 2021;116(3):516-658, DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20201238.

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Fomento e Agradecimento:

A pesquisa não recebeu financiamento.

Critérios de autoria (contribuições dos autores)

Mara Ribeiro1 e Francisco Ferreira2 colaboraram na administração, no desenvolvimento da pesquisa e na coleta e análise dos dados;

Adriano Belarmino, Kamyla Pedrosa e Antônio Bezerra contribuíram na redação do manuscrito original;

Francisco Pinto contribuiu na supervisão e revisão do manuscrito.

Todos os autores aprovam a versão final do manuscrito e concordam em ser responsáveis por todos os aspectos do trabalho.

Declaração de conflito de interesses

Nada a declarar.

Editor Científico: Ítalo Arão Pereira Ribeiro. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-0778-1447

 

Rev Enferm Atual In Derme 2025;99(supl.1): e025056                   

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